quinta-feira, 29 de outubro de 2015

O meu tocaio de nascimento



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

O país Argentina merece umas reflexões que os brasileiros – por conta de uma rixa fabricada – teimam em não fazer. E são muitas.
Admiro aquele estilo “sangue nos olhos”, acho que minhas origens castelhanas trazem um pouco desse sangue. Mas o fato é que a Argentina produziu algumas figuras que foram expoentes máximos nos seus respectivos campos de atuação. Gostaria de citar apenas quatro argentinos que são extremamente populares na América Latina e, porque não dizer, no mundo. Diego Armando Maradona, Jorge Luis Borges, Ernesto Guevara e Jorge Mario Bergoglio Sívori. Pessoas reconhecidas por seu talento e trajetórias contundentes.
Cada um desses castelhanos foram, e são, sumidades nas suas áreas de atuação. Guardadas as contradições, todos admiráveis.
Mas Dieguito foi o cara que jogou uma bola, pra lá de redonda, quando eu era um torcedor do futebol arte. E era fã do Tele Santana. O talento para o futebol é para poucos. E Maradona jogava como poucos.
Muitos anos após descobri que Maradona nasceu no mesmo dia, mês e ano que eu: 30.10.1960. Costumo brincar que Maradona é meu tocaio de nascimento. Nesse caso, tamo junto. 5.5 nesse 30 de outubro.
Já admirava antes, mas consolidei minha opinião – talvez por essa coincidência – de que Dieguito é o maior atleta de futebol de todos os tempos. Sei que não é difícil para os cronistas esportivos brasileiros lerem uma quebra de paradigma, porque, nesse caso, os brasileiros tem uma cláusula pétrea para o melhor do mundo. Intocável, indiscutível. Mas as cláusulas pétreas foram feitas para serem revistas. E, também, depende dos parâmetros de julgamento. Nos meus critérios de avaliação para eleger o melhor atleta de todos os tempos eu considero o talento com a bola, inteligência e consciência política [rs].
Então, nos meus critérios Diego Armando Maradona é o melhor de todos os tempos. E nesse dia eu abrirei um Malbec argentino para comemorar. Que venham mais 55.

Ah! Nesse dia trinta também fazem aniversário a cidade de Dom Pedrito e Fiodor Dostoievski.

terça-feira, 20 de outubro de 2015

Por uma seleção brasileira do Brasil



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

A crise porque passa o Brasil está representada nos mais variados segmentos da sociedade. Estamos vivenciando uma crise política, econômica, de conduta, de lideranças e também no futebol, agravada com o vexame da Copa de 2014 diante da Alemanha.
Os jogos das Eliminatórias – que eu acho que deveriam se chamar Classificatórias – da copa do mundo nos revelam uma seleção que requer alguns cuidados táticos para evitar a “Neymardependência”. Se em outros tempos tínhamos um craque em cada posição, hoje temos apenas o deslumbrado do Neymar.  
Eu, particularmente, não estou empolgado com essa seleção de Dunga. Não me cativa como já cativou as seleções de 82 e 86. Falta brasilidade nos atletas. Falta paixão de torcedor nos jogadores. Não temos mais comemorações memoráveis como aquela do Falcão no gol contra a Itália em 82. A do Bebeto em 94. Ali estava representada toda a garra de um atleta e torcedor. Uma atitude que contagiava a torcida. Uma devoção pelo país que estava representando. Falta humildade nos atletas.
Penso que falta ao escrete canarinho atletas brasileiros em campo. Eu sou adepto de uma escalação com jogadores atuantes no Brasil [tudo bem, três jogadores atuando fora]. Uma escalação cujos sobrenomes dos atletas sejam: o fulano do Inter, o beltrano do Flamengo, o cicrano do Corinthians, o manezinho do Avaí – apenas uma citação, compreendido? – e assim por diante. A torcida pelos clubes é mais apaixonada, e se esses clubes tem atleta na seleção, a excessiva paixão será automaticamente transferida com a mesma energia. Desejo uma seleção brasileira com jogadores atuando no Brasil. Nem que fosse em caráter experimental num torneiozinho mixuruca em 2016.
Tenho a sensação que despertaria aquele velha vocação de torcedor da seleção que encantou o mundo em várias copas. Aí os fiascos protagonizados pela CBF estariam, exclusivamente, fora das quatro linhas do gramado.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Xavante na série B



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Certa feita, estávamos em Buenos Aires tomando um cafezinho no aeroporto e aguardando a conexão. De repente, uma barulheira pelos corredores e logo em seguida cruza a torcida do Corinthians – aquele bando de louco –, estavam acompanhando o time em um jogo pela Libertadores. Um castelhano na mesa ao lado puxa conversa criticando a falta de educação desses brasileiros. Concordei com meu portunhol e ele apontou o dedo para mim.
– Usted es brasileño?
Tive que concordar, mas puxei da carteira minha carteirinha de sócio do Internacional. E fiquei em paz aguardando a conexão.
– São uns arruaceiros.
O castelhano não entendeu bem e eu não iria traduzir para “acalleceros”, nem sei se isso existe.
Semana passado eu estava no aeroporto Salgado Filho, aguardava o voo para São Paulo, quando vejo um bando de fanáticos, todos fardados com as indumentárias do Brasil de Pelotas. A torcida do Xavante estacionou no mesmo portão onde eu estava. Acho que tenho vocação para acompanhar equipes de futebol em jogos decisivos. Esse voo promete, pensei contemplando a aeronave. E continuei minha leitura de “O leitor do trem das 6h 27”. Não tinha outra opção, fiquei aguardando o embarque do voo das 10h 25.
Foi uma viagem tranquila e eu quebrei a cara. A turma do Brasil era silenciosa e a conversa cheia de esperança. Fiquei na fileira entre dos Xavantes, papeamos sobre o futebol do interior e das possibilidades do Brasil de Pelotas em Fortaleza. Disse que estava na torcida, afinal, seria muito bom para o futebol do Rio Grande do Sul ter um representante na serie B do Brasileirão. Sem falar nas verbas publicitárias e no televisionamento dos jogos. Uma visibilidade para o clube e para os atletas. Mas interiormente, sinceramente, eu não acreditava. Uma luta inglória. Eu quebrei a cara pela segunda vez.
Parabéns a toda apaixonada torcida do Xavante.

domingo, 11 de outubro de 2015

De como estocar o vento



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Os discursos da presidente Dilma são inspiradores. Os cronistas políticos agradecem os pensamentos pós-modernos e vanguardistas quando ela envereda para o improviso. Imagino, quero crer, que tenta uma linguagem popular, mais voltada para o povo. E sem o traquejo de seu antecessor, descamba para o risível. Para uma filosofia de botequim.
A última: estocagem de vento. Convenhamos, no Ponto de Cinema Bar teríamos panos para a manga por horas a fio.
A militância das redes sociais é fiel. Disciplinada e ordeira e multiplica explicações de vento em popa. Eu fico perplexo lendo os textos de alguns “ministros” da Dilma tentando explicar sobre a possibilidade de estocagem de vento. É uma atitude louvável, admirável até esse esforço militante, mas é mais ou menos como explicar a geração infinita de energia amarrando um pão com manteiga nas costas de um gato.
Mas quando se falou, pela primeira vez, em vento estocado eu lembrei que na minha tenra infância existia um tal vento encanado. Então, concluí que seria relativamente fácil armazenar ou estocar o vento, bastava antes de tudo saber como encaná-lo. E encanar o vento é coisa da vovó.
Muito antes de a Dilma estocar o vento, minha vó encava. Minha vó entendia bem de “vento encanado”, inclusive ela sofria de vento encanado e era um mal curado com agasalho. Do vento encanado para a pontada era um pulo.
Como encanar o vento?
Em dia de ventania temos que abrir, simultaneamente, a porta da frente da casa e a porta do fundo. Todas as demais aberturas devem permanecer fechadas. Então, quando o vento entrar pela porta da frente, automaticamente, ele vai sair pela porta do fundo. Aí teremos o vento encanado. Agora, temos que ser rápidos o suficiente para fechar a porta do fundo e da frente após o vento ter entrado, nesse instante teremos o vento estocado, ou armazenado, ou aprisionado. Como deseja a presidente.
Essa experiência poderá ser feita, com certa facilidade, em Santa Maria nos dias de vento norte.
Se, após todos esses procedimentos, a experiência não der certo, não basta se queixar para o bispo, tampouco para a Dilma, porque ela está caminhado contra o vento, sem lenço e sem documento...

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Adão Latorre e Xerengue estão gargalhando



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

É lugar-comum, aqui no Rio Grande do Sul, quando queremos salientar o grau de disputa ou rivalidade, buscarmos análises comparativas nas contendas entre chimangos e maragatos – se o assunto for política – e na rivalidade Gre-Nal, se o tema for futebol. 
Chimangos e maragatos viviam – e morriam – em eternos confrontos por conta de disputas políticas e a cor de um lenço. A degola era a menos cruel das ações dos caudilhos lá no início de século passado. E a dupla Gre-Nal era, apenas, uma rivalidade esportiva. Hoje, os chimangos e maragatos se contentam numa rivalidade de CTG na dança da chula e a agressividade migrou para os estádios com torcedores, digamos assim, um pouco mais exaltados. Contabilizamos mortes nos estádios por esse Brasil afora por conta do fanatismo e intolerância por quem torce para uma equipe diferente. E vamos chorando nossas jovens mortes e lamentando tanta incompreensão.
Recentemente faleceram Kita jogador de futebol e Jose Eduardo Dutra político do PT. Duas pessoas com, praticamente, a mesma idade e que enfrentaram longa enfermidade.   
Toda morte é motivo de reflexão sobre a vida e a nossa passagem por ela. Algumas são mais sentidas porque são pessoas próximas – amigos, parente e conhecidos –, outras menos doloridas, mas também reflexivas, pois podem ser jovens vitimados por uma tragédia – Santa Maria conhece muito bem essa dor – ou pessoas que admiramos, ou não, por sua atuação na sociedade.
Eu gostaria de escrever, apenas, um lamento pelas mortes de Kita e José Eduardo. Amigos próximos, parentes, torcedores e políticos devem estar sentidos. Ambos morreram jovens. Muito tempo antes do que recomenda as estatísticas.
Mas o que nos deixa descrente com a humanidade e com a política foram os protestos no velório de José Eduardo Dutra. A gente é pego na contramão da lógica. Uma atitude inimaginável para seres ditos “homo sapiens” que deveriam respeitar a dor alheia. Então, ficamos sem saber o que dizer. Profundamente embasbacados, boquiabertos. Ainda quero crer que se trata de uma ínfima minoria. Assim espero. Caso contrário, estaremos caminhando a passos largos para a barbárie. Mas um dado é factível: a intolerância é a marca de nosso tempo e a intransigência o modus vivendi.
Chimangos e maragatos já não peleiam mais. Torcedores da dupla Gre-Nal, muito acanhadamente, encaminham a paz nos jogos com a torcida mista. Mas temos várias intolerâncias: política, religiosa, racial, afetiva e esportiva. Algumas pessoas têm dificuldade em conviver com quem pensa diferente. O contraditório deixou de ser dialético para ser ódio e raiva. Resolve-se as divergências na porrada. Nossa sociedade está muito violenta e violência gerada por motivos fúteis, na maioria das vezes.
A intransigência dos dias atuais encaminha-se para o renascimento de uma luta fratricida nos moldes dos chimangos e maragatos, num salve-se quem puder. E quando não for possível mais dialogar, Adão Latorre e Xerengue darão gargalhadas no inferno.