quinta-feira, 16 de abril de 2020

Um segredo santiaguense revelado


Preciso contar um grande segredo – guardado a sete chaves – lá de Santiago do Boqueirão de quem não é bandido é ladrão.
Até hoje, só os mais velhos, com mais de 60 anos, se atrevem a comentar. Tudo, como sempre, em bocas de Matilde. Mas como sou parte envolvida nesta história resolvi expor para o mundo esta bombástica revelação.
Donald Trump esteve em Santiago!
Ele veio, em meados da década de 1960, para participar da reunião do G8... G1... G10... sei lá, mas veio.
Era o auge da guerra-fria e Santiago foi escolhida porque o “Mister White” – colunista social de então – fez um grande acordo entre as partes e possibilitou a reunião. Os gringos pensaram que “Mister White” também era gringo, republicano e do Texas. E se vieram! Mas isso é outra história.
Consta que a música “Os homens de preto” foi inspirada por conta do desembarque de Trump e sua trupe no aeroporto clandestino construído para esse fim específico. Paulo Ruschel estava por aquelas bandas e compôs o clássico gauchesco.
Mas porque estou contando isso só agora?
Simples. Por conta do dia das crianças em que os amigos do Facebook colocam fotos de quando eram criancinhas fofinhas para deleite de filhos e netos.
Então, fui postar a minha foto e vi que ela foi tirada por um perspicaz fotógrafo – que não lembro o nome – no momento em que Trump e sua trupe de puxa-sacos adentrava no recinto da Escola Silvio Aquino.
Aqui, também, postei a minha foto quando me deparei com o futuro presidente dos EEUU.
Athos 1 x 1 Greta. Talkei?

quinta-feira, 9 de abril de 2020

Assembleia dos gados


Nestes tempos de destemperos verbais e físicos e filtros na mídia, uma notícia foi como uma bomba entre a gadaria. Um alvoroço geral nas pastagens. Uma grave denúncia de extermínio à comunidade. Assunto muito grave. O gado seria banido da face da Terra.
Não tinha mais o que protelar. A convocação de uma assembleia seria urgente para decidir o que fazer. Organizar a gadaria.
A assembleia extraordinária dos quadrúpedes em geral foi aberta no pastiçal à sombra de um umbu. Havia uma grave e preocupante denúncia contra um de seus protetores.
O gado-mor abriu a reunião convocando a mesa para dirigir os trabalhos. Claro, ele, o gado-mor seria o presidente e mais dois por conta das tendências dos gados: um cavalar e um muar.
Fez a costumeira saudação aos presentes e com a voz empostada comunicou que havia uma grande conspiração para acabar com a vida do gadario. Seriam eles todos transformados em bife, guisados e churrasco. Espanto geral nos presentes. Mugido de todos os naipes. Até o cavalo lobuno – único presente na reunião – deu um coice no ar. E relinchou raivosamente externando seu apoio ao movimento gadadista. 
O gado-mor complementou que uma organização criminosa estava exterminando tudo quanto era gado. E a reforma no estábulo e nos cochos era pura enganação. Aquela história de um mundo melhor era outra trapaça dos criminosos. Ração boa, água e banho era tudo para engambelar os incautos. Havia um conluio entre os produtores, frigoríficos e supermercados, armazéns, açougues e botecos em geral para exterminar a família gado do planeta.
Novo espanto na plateia. Não pode! O proprietário era uma pessoa boa. Era o patrão e tinha de ser respeitado. O peão que cuidava dos gados era, praticamente, da família dos quadrúpedes. Com a única diferença que andava em duas patas...
Uma balbúrdia tomou conta da assembleia. Confusão e discussões. O nelore e o charolês quase foram as vias de fato.
Então o gado-mor apaziguou os ânimos e falou que a gadocept havia interceptado uma conversa entre o dono do frigorífico e o dono da fazenda – o nosso mui amado patrão – e colocou o áudio da conversa para todos ouvirem.
O charolês pediu a palavra e disse que tudo aquilo era teoria da conspiração. Não acreditava em nada daquele áudio e, além do mais, interceptar conversas era crime previsto na lei. E aquele áudio estava editado.
O nelore pediu a palavra para contrapor, mas neste instante o peão da fazenda o incansável Rubi Muarlone arregimentou todos para o banho e logo em seguida para o curral.
Só o picaço relinchou, novamente, e se mandou campo fora.

quinta-feira, 2 de abril de 2020

A casca da bergamota


Coloquei duas bergamotas na mochila e fui fazer uma caminhada na city. Enveredei lá para os lados da BR 158. É perigoso andar pelo acostamento, mas estava propenso a ir até a ponte metálica – do Cerrito – para ver o atual estágio das obras. E de quebra tirar umas fotografias. Espanto! A ponte de concreto estava pronta e a metálica sendo desfeita. O tablado já não existia mais. Fotografei com um pingo de saudade.
O progresso é racional e não tem sentimentos. A emoção salta nos livros de história e na memória da comunidade.
Retorno.
Resolvo saborear as bergamotas. Era o que tinha para o momento para seguir adiante na caminhada e em minhas reflexões. Os pensamentos ficam em dia quando temos um pôr de sol na espreita. E quilômetros a cumprir.
A tarde caia como um viaduto – de metal – e na quadra seguinte precisei abrir um container para colocar as cascas de bergamota. Afinal, faço parte da parcela da sociedade que gosta da cidade limpa. Mas nem todos têm esse intento. Ao lado da lixeira havia um sofá velho, dois pneus carecas, uma Barbie velha e cabeluda e a carcaça de uma máquina de lavar roupas. Isso está virando rotina em Santa Maria. As pessoas colocam móveis velhos nas calçadas à espera de que o poder público providencie a remoção. Caso contrário, culpa do prefeito.
Imaginem se todos os cidadãos resolvem fazer o mesmo? Mas o que mais me chamou atenção foi o interior do container. Não havia lixo, e sim entulhos.
Seria um entulho autoritário?
O morador próximo fez uma pequena reforma em casa e resolveu usar o container de lixo para se livrar do tranqueira toda ao invés de contratar um tele-entulho. Imaginem se todos os santa-marienses resolvem fazer o mesmo?
Nós, brasileiros, temos que mudar e muito nossas atitudes com o público, com a vida cotidiana.
Eu não tenho a intenção de comparar um caso isolado numa via pública – de pessoas sem educação – com os altos índices de corrupção no Brasil. Essa história de cumprimentar o porteiro não redime o corrupto das cifras dos milhões e nem o que fura a fila no supermercado. Até hoje ainda tenho dúvidas se os que estão lá em cima – nas altas esferas da república – são a representação do que realmente é a população, ou se as pequenas corrupções do dia a dia são o reflexo do que acontece nas altas esferas da república.  
Mas a comparação é inevitável. A nossa atual conjuntura é muito reflexiva. E de profunda introspecção.
Coloquei a casca de bergamota no container e continuei minha caminhada. O pôr do sol estava lindíssimo. Contemplativo.