sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

O cofre do Dr. Rui e a "punheta ideológica"

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

O Brasil precisa conhecer a sua história. Precisamos refletir sobre os anos de ditadura. Os anos dos atos institucionais.
O livro de Tom Cardoso “O cofre do Dr. Rui” narra de forma romanceada uma das maiores expropriações da luta armada nos anos de chumbo.
No dia 18 de julho de 1969 onze guerrilheiros da Var-Palmares assaltaram um casarão onde constava parte da fortuna do ex-governador de São Paulo Adhemar de Barros. O livro trata com fidelidade os fatos históricos. Nos coloca dentro da guerrilha e nos transporta para o passado com uma leitura que flui com velocidade. Rápida como a ação dos guerrilheiros.
Nesse passeio pelos anos de exceção podemos perceber todos os traumas, tramas e traições vividos pelos revolucionários e repressores. Sonhadores e idealistas.
Logo nas primeiras páginas percebemos que o machismo também estava nas hostes da luta armada. Diante de uma companheira que estava ávida por aulas de tiro, ou por participar de um ato guerrilheiro, o ex-sargento José Araujo Nóbrega perguntava “O que uma mulher faz se menstruar no meio de uma ação de guerrilha?”.
Nas visões de luta havia os “foquistas” e os “masssistas”. Os foquistas queriam logo pegar em armas tanto no campo como nas cidades. Os massistas acreditavam num processo mais lento, greves, ações de guerrilha e manifestação de massa. Assim, a VPR – Vanguarda Popular Revolucionária – rejeitava a “punheta ideológica” dos massistas – bando de “bunda-moles” – como diziam.
E foi no planejamento que Lamarca batizou o assalto de “Grande Ação”. O resultado da grande ação foi a quantia de 2 milhões e 598 mil dólares. Em valores atuais equivaleria a 15 milhões de dólares. Mas é a partilha que vai degringolar ou acentuar as desavenças no âmbito da luta ramada. Em contraponto ao roubo do cofre os repressores escancaram a repressão em busca dos guerrilheiros e do dinheiro do cofre. No lado dos guerrilheiros a “briga” para a partilha dos dólares. No final do livro temos uma cronologia dos fatos de 1961 a 1985. E o destino dos personagens.
Gustavo Schiller o personagem que avisou os revolucionários sobre a existência do cofre resume numa frase emblemática o saldo da luta armada no Brasil. Em 1985 desiludido, cético, não acreditava no movimento das Diretas-Já. Com a posse de José Sarney repetia sempre a mesma frase: “Foi para isso que eu lutei?” Gustavo jamais se recuperou dos anos de tortura. Cometeu suicídio em setembro de 1985.
O livro vale a leitura. A história contada por personagens vivos. Uns até vivos demais.
Eu só não entendi a foto da Wanda na capa. A participação de Wanda foi, apenas, em se passar por estrangeira para trocar os dólares na casa de câmbio do Copacabana Palace. Mas eu acho que entendo, a foto de Wanda dá uma ajudinha nas vendas. Afinal, Wanda nada mais é que o codinome que Dilma Rousseff usava na guerrilha. Esse pequeno detalhe não desmerece, nem um pouquinho, o livro.
Por que Dr. Rui? Porque era assim que Adhemar de Barros chamava a sua amante.
Por que eu agreguei o “punheta ideológica” no título? Ora, para chamar atenção para a leitura e porque gostei do termo. Se eu vivesse naqueles tempos, estaria ao lado dos “punheteiros”.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

E se a vaca voltar do brejo

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

A vaca foi para o brejo. Essa é a premissa para ilustrar uma desilusão. Uma perda. Ou simplesmente expressar espanto diante de um infortúnio.
Por vezes a desilusão é muito intensa e o vivente sente-se compelido em acompanhar a vaca na sua trajetória.
A vaca foi para o brejo quando Messi tocou por cima do goleiro do Santos e abriu a enxurrada de gols. Também foi para o brejo quando kidiaba dançou aquela máscula dancinha comemorando o gol do Mazembe. Para os que se autoproclamam “imortais” e fazem uma suspeita avalanche em cada gol, cabe saber se segunda divisão está localizada no brejo ou nas cercanias. Mas isso é assunto para os especialistas. E, assim, no futebol a vaca vai para o brejo para uns e ao paraíso para outros. Nesse caso paraíso e brejo fazem uma disputa muito animal.
A política é um dos setores que mais contribui para o brejo. O lodaçal da política é muito concorrido. Haja brejo para tanta vaca! Manadas de vacas é a síntese dessa trilha do brejo.
Nas eleições presidenciais de 2010 após aquela alaúza toda por uma simples bolinha de papel a vaca mugiu para o Serra. E quando o candidato tentou um tiro de laço para trazê-la de volta, era tarde demais. O animal já estava fechando a cancela do brejo.
Acabou no brejo quando o ministro falou “nem a bala” e ficou no atoleiro quando disse “eu te amo, presidente”. Nesse instante todos já sabiam qual o destino da vaca do ministro. Sabemos que a batata assa momentos antes de a vaca tomar o rumo do brejo, no caso do ministro, não chegou sequer ficar dourada. Nesse caso a vaca da opinião pública estava em verdejantes pastagens.
Outro indício de vaca e brejo nos ministérios é quando o ministro fala: eu posso explicar. No máximo a batata doura antes de a vaca tomar o rumo do brejo. Vai para o brejo ruminado por mais uma queda.
No atual momento do Brasil são tantas a situações que o brejo deve estar com uma manada de vacas. Logo teremos que construir brejos sustentáveis para abrigar tamanha quantidade de gado vacum.
Uma questão a ser verificada é se a vaca voltar do brejo.
Seria o caminho da vaca um caminho sem volta? Penso que não. A vaca poderá voltar das mais variadas maneiras. Fazendo embaixadinhas com novas vitórias do Internacional em um próximo mundial FIFA. Com um cabelo moicano se o Neymar amadurecer numa improvável decisão com o Barcelona num futuro imediato. A vaca poderá voltar do brejo em forma de justiça. Colocando corruptos e meliantes na cadeia.
No entanto, se a vaca voltar do brejo cheia de pulseiras, anéis, colares de vários tipos, brincos e com uma exagerada maquiagem, ela será uma vaca-perua recém chegada e senhora de si. E se a vaca expuser um diploma de doutorado, temos que redobrar os cuidados. Tranquem as portas das universidades, pois ela poderá acabar em uma banca de avaliação. Ou pior, dando aulas na instituição.
Enfim, um dado é certo, quando uma vaca vai para o brejo outra encontra um imenso pastiçal.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Um pêssego

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

”Na outra margem alguém me espera com um pêssego e um país”
Os versos de Mario Benedetti no poema “A ponte” nos dão a dimensão do momento histórico e político em que vivemos. Estamos atravessando uma ponte, mas somos acometidos por uma inquietação: cruzá-la ou não cruzá-la, pois do outro lado da margem uma pessoa nos espera com um pêssego e um país.
Um poema reflexivo. Lendo-o, viajamos pelo imaginário complexo do que seja a espera de um cidadão com uma fruta com toda a singeleza que encerra e uma nação com todas as suas idiossincrasias.
A mensagem parece simples. E é. Mas, dialeticamente, também é complexa.
Talvez porque ao chegarmos na margem, após vencermos o medo da travessia, nos deparamos com um pêssego e, de quebra, um país.
O que fazer com um país e um pêssego? Não podemos escolher, a mensagem é pródiga em reflexão, justamente porque é inusitada.
Quando o povo brasileiro com coragem venceu o medo e votou na esperança e elegeu um operário presidente da República, estava caminhando por uma travessia de incertezas e não vislumbrava na outra margem um país, quiçá um pequeno e maduro pêssego.
Nós temos certeza do que queremos para um país.
O pêssego e o país. Essa é a dialética necessária. O pêssego é singelo, frágil, indefeso, simples e é possível apalpá-lo. O país é complexo, composto, gigante e para administrá-lo os desafios são grandiosos.
Esse é o maior desafio. Administrar um país como quem saboreia um suculento pêssego. É simples o que fazer com um pêssego, é complexo o que fazer com um país.
Mas nesse poema o pêssego é fundamental. Ele só é poema porque alguém está a espera com um pêssego... e um país.
Embora alguns desencantos e sonhos perdidos nós ainda percebemos uma pessoa na outra margem e vemos com nitidez um país e um pêssego. Trazemos apenas os olhos cansados, um andar falquejado e mãos trêmulas que rogam por paz e justiça e, na maioria das vezes, por um prato de comida. No entanto, nosso sorriso é largo porque somos nós que enfrentamos essa travessia em busca dessa fruta.
E, enquanto a oferenda for um pêssego e um país nós ainda podemos acreditar na utopia que nunca deixará de ser possível.
Nós perderemos a esperança quando alguém na outra margem nos espera apenas com um país. Aí, sim. Será o fim do que resta de uma utopia possível, pois não descascaremos uma fruta e não lambuzaremos nossas mãos com o seu caldo antes de comandarmos um país.


Abaixo transcrevo o poema.



A Ponte



Pra cruzá-la ou não cruzá-la

eis a ponte

na outra margem alguém me espera

com um pêssego e um país

Trago comigo oferendas desusadas

entre elas um guarda-chuva de umbigo de madeira

um livro com os pânicos em branco

e um violão que não sei abraçar

Venho com as faces da insônia

os lenços do mar e das pazes

os tímidos cartazes da dor

As liturgias do beijo e da sombra

Nunca trouxe tanta coisa

nunca vim com tão pouco

Eis a ponte para cruzá-la ou não cruzá-la

E eu vou cruzar sem prevenções

Na outra margem alguém me espera

com um pêssego e um país.



(Mário Benedetti)

História do PT

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

A espera foi longa – dois meses – pela chegada do livro “História do PT” de Lincoln Secco, encomendado na Cesma. Até hoje não entendi o motivo da demora, penso que foi distribuição. Mas isso, agora, não vem ao caso.
Confesso que num primeiro momento após ter lido algumas resenhas sobre o livro julguei tratar-se de loas, loas e mais loas ao partido. Mas não foi o que li.
Para quem gosta de política, acompanhou atentamente a redemocratização do Brasil ou votou em Lula em alguma eleição a leitura é obrigatória. Para quem ama o partido pode ser indigesta e para quem odeia, esclarecedora. Podemos pinçar epopeias como também falcatruas. Mas um livro fundamental para nossa compreensão política. Pois, um partido é formado por pessoas e pessoas erram e acertam. E o PT nunca teve imune a esses desatinos.
A temática é atraente e o historiador sabe contar a história. Secco faz um relato honesto da trajetória do PT nessas três décadas. Nos mais variados acertos, sonhos e utopia, como também, nos desencontros e contradições. A análise de Secco é assentada na razão – vamos dizer fria – da história.
Quando entendemos as origens do PT poderemos compreender o atual estágio porque passa o partido. Fica identificada a evolução da composição interna das tendências, as disputas pelo poder dentro da agremiação e os embates ideológicos nos congressos e encontros e atualmente a disputa por espaços nas máquinas dos governos. Um dado é óbvio: O PT não é mais o mesmo da sua fundação.
Sabemos que o PT foi fundado por três seguimentos: Igreja, grupos da luta armada e sindicalistas. Mas o autor desdobra esse tripé. Então, ficamos com seis fontes no nascedouro do partido: Sindicalismo, igreja, políticos estabelecidos no MDB, intelectuais, militantes de organizações trotskistas e remanescentes da luta armada. Olhando-se dessa maneira podemos ver a complexidade que é o PT no campo da ideologia. O partido no seu nascedouro era um turbilhão ideológico. Ao conquistar os governos e precisando administrar, essa teia fica arrefecida nas engrenagens das administrações. Mas pulsante no interior do partido.
Algo, para mim, foi novidade ou havia esquecido. Os debates sobre políticas de aliança na década de noventa consta que alguns deputados queriam uma aliança orgânica com o PSDB, dentre eles, o dep. Eduardo Jorge PT-SP defendia essa ideia. Diante dessa frase meu avô diria: Ala pucha!!
A segunda derrota eleitoral a presidência houve uma verdadeira guerra verbal. E um grupo de deputados – um deles o Genoino – tinha o apoio da imprensa para fustigar o PT. Afinal, a história também nos surpreende. E alguns porquês a gente vem a entender muito tempo depois.
Outro dado que passou despercebido pelo militante comum foi que um dirigente do partido ganhou uma grana vendendo o mapa das tendências para consultoria empresarial. E isso torna-se reflexivo quando olhamos para o nascedouro do PT. Ao longo do tempo o partido vai perdendo suas mais caras convicções. Se lá no começo “O PT afirma seu compromisso com a democracia plena exercida diretamente pelas massas, pois não há socialismo sem democracia e nem democracia sem socialismo”. Pg 101. O capitulo sobre a “Carta ao Povo Brasileiro” é aberto com uma frase de Eric Hobsbawm “as oposições não conseguem vencer apenas por mérito próprio. No geral, é o fracasso dos governos que garante a vitoria”. Emir Sader afirma “quando a esquerda chegou ao governo central no Brasil ela já havia perdido a batalha das ideias.”
Atualmente, para Hobsbawm o PT pode ser considerado o último exemplo de um partido social-democrata de massas. Para Jacob Gorender o PT assumiu o comportamento moderado de um partido social-democrata.
Com todas as contradições acertos e erros o PT foi fundamental para a democracia brasileira. Queiramos ou não, o PT faz parte da história recente do Brasil e detém uma contribuição significativa para o aprimoramento dessa democracia. Lincoln Secco nos conta a história do PT, mas, indiretamente, conta a história do Brasil e da esperança de um povo num partido de massa e num líder operário.
No final do livro temos uma interessante cronologia de 1978 a 2011. Um glossário onde veremos a definição para “Capa Preta”; “Duas camisas”; “Tese-guia”; “Trotskistas”; “Xiitas”; “Questão de ordem” e outros tantos termos da vida partidária. Também temos um quadro com a evolução das tendências. Assim, os consultores empresariais não precisam pagar para ter acesso a elas.
“História do PT” um livro para ser lido por todos aqueles que gostam e odeiam a política. Eu li – e recomendo – porque gosto.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Glândulas coxais e o cupreto de Índio

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

O Colégio Estadual Manoel Ribas nos reserva doces lembranças dos tempos de estudante secundarista. Algumas peripécias enquanto jovens nós guardamos em um cantinho especial de nossas saudades.

Eu cursei as últimas séries do ensino fundamental e o ensino médio no Maneco. Foi naquele amplo pátio que cruzamos nossos primeiros olhares e despertamos as primeiras paixões juvenis. E foi através desses olhares desencontrados que uma garota de olhos e cabelos castanhos ocupou boa parte dos meus pensamentos e um largo latifúndio no meu improdutivo coração.

Embora tenha sido um dedicado desportista eu não tinha a mínima aptidão para o vôlei e para o handebol. Não tinha altura suficiente para o basquete e era pouco criativo no futebol. Hoje, agradeço ao divino por não ter sido iludido com meus parcos talentos com a bola. Em química era como no futebol. Dava para o gasto, mas jamais seria um Linus Paulling. Nos estudos eu era fera em matemática e péssimo em português. Gostava de história e literatura e odiava inglês. Até hoje tropeço no “How are you?”.

O nosso ciclo juvenil encerrava com o fantasma do vestibular. Os cursinhos eram peritos em elaborar estratégias com a finalidade de memorização. Os conteúdos eram transformados e facilitavam o aprendizado ou a “decoreba”, como se dizia outrora. E, em seis meses o aluno estava apto para enfrentar o dito “fantasma”. Havia um locutor de rádio que dizia “veeeeeeeeeeeesssstibular” e o nosso coração saia pela boca.

Tínhamos ciência que o ano que antecedia ao vestibular mudaria o rumo de nossas vidas. E por isso estudamos muito, algumas dicas ainda permanecem em nossas mentes e jamais esqueceremos. Porque foram marcantes. Antigamente fazia-se cursinho no último ano do segundo grau. Os menos favorecidos, no segundo semestre e os ainda menos favorecidos, que era o meu caso, apenas o intensivo de dezembro. Não havia outro jeito, tínhamos que viver debruçados nas apostilas, que naqueles tempos chamávamos de polígrafos. Hoje, com essa nova modalidade de ingresso ao ensino superior os pais têm que se preparar para desembolsar três anos de cursinho e mais o curso pré-vestibular do último ano e o intensivo, lógico.

Voltando às dicas, a tabela periódica era pródiga em siglas e frases que facilitavam a memorização. “H LiNaK Roubou o Cézio do Frâncio”. Incrível, não? Ou então. “BeBa Magnésio Senhor CaRa”. Nossa!!

As três Leis de Newton eram obrigatórias. A que eu mais gostava era a Lei da Inércia, se não me engano, a primeira Lei de Newton. Era utilizada como desculpa para não fazer os exercícios em sala de aula. Ou seja, um corpo em repouso. E, estava praticando a primeira Lei de Newton. Aí a “profe” que naquela época era “fessora”, me mandava pelo MRU em direção a sala da Direção.

O binômio de Newton era algo absurdo. Deste tamanho. Esse eu não me lembro. A biologia era um horror, como alguém guardaria aquela montanha de nomes, todos estranhos e, na maioria das vezes, em latim. Alguém se lembra do que é um mitocôndrio? Monocotiledônea? Platelmintos? Gimnosperma não é um potente espermatozoide.

As minhas melhores notas sempre foram em trigonometria. O seno de um ângulo era o cateto oposto pela hipotenusa – que eu sempre achei que fosse alguma coisa ligada ao hipismo. A tangente era o cateto oposto pelo adjacente. Será que ainda é?

Bonita mesmo era a fórmula de Báskara. “Sobre dois a”, era um fecho fenomenal. Era um poema cubista. Você recitava um monte de letras e raiz no numerador e fechava o denominador com o “sobre dois a”.

Hoje, percebo que o Teorema de Pitágoras tem uma plasticidade de causar inveja a uma escultura de Auguste Rodin. O quadrado da hipotenusa (ela de novo, a Deusa do Hipódromo) é igual a soma dos quadrados dos catetos. É como a cerveja que desce redondo. E eu diria que essa Deusa têm belos e fartos catetos.

Em português eu tinha uma contrariedade com aquelas malditas orações. Eu nunca soube e até hoje não sei identificá-las. Eu era incomodado com as orações subordinadas. A injustiça sempre me causou indignação. Então, antes de saber qual era a oração eu ficava ansioso para saber o porquê de toda aquela subordinação. Eu queria orações livres. Orações libertas e adversativas. As orações subordinadas eram simplesmente inaceitáveis. Acho que o golpe de 64 tem alguma coisa a ver com as orações subordinadas.

Até admitia que uma oração conformativa pudesse ser subordinada, mas não admitia que uma oração adversativa fosse coordenada, eu achava inconcebível. Adversidade não se coaduna com coordenação. Era o que eu pensava. E talvez por isso eu nunca aprendi. Apenas identificava as que começavam com “mas”. Justamente as coordenadas adversativas.

Eu não sei se, por um complexo malresolvido ou um desvio pseudoerótico de minha conduta, mas dois momentos daquelas memoráveis dicas eu jamais esqueci, aliás, não eram dicas, eram nomes que lembravam, de certa maneira, uma sensibilidade supostamente sensual e escandalosamente pornográfica. São as “glândulas coxais” e o “cupreto de Índio”.

Parece brincadeira, mas as glândulas coxais nós encontramos nas aranhas que é um aracnídeo e o cupreto de Índio é uma substância química composta pelos elementos cobre e índio, cuja fórmula eu não me lembro.

Por isso, quando vemos as Sheilas dançando lembramos dos aracnídeos. Elas, sim, possuem as verdadeiras glândulas coxais.

Já os Caingangues... os Pataxós... deixa pra lá.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Bem-vindos ao inferno

Como a literatura é divina, infernal e bonita! Nossos pensamentos vagueiam em contradições, numa dialética bicolor. A literatura é grandiosa, vasta e infinita. E, hoje, cada vez mais instantânea e virtual.
Esse livro de crônicas – cujo título homenageia a Galera no Beira-Rio , “Bem-vindos ao inferno” – tem o intuito de transformar nossa paixão pelo Internacional em uma leitura prazerosa.
Os deuses fazem literatura. Essa é a premissa. Os deuses... e os diabos. O céu e o inferno.
Os que escrevem a verdade. Escrevem certa verdade, sendo deuses ou diabos. Estando no céu ou no inferno. São os paradigmas de quem tem o vermelho da paixão. Assim, como os deuses escrevem? Certo e com a razão, talvez até escrevam em azul. Os diabos escrevem errado e com a emoção, talvez escrevam em vermelho.
A literatura tem os temperos do céu e do inferno. Os deuses temperam com ervas aromáticas e os diabos, com pimentão. O vermelho é “caliente”, é latino-americano. O azul é polar, é Antártida. O vermelho e o azul, essa é a bipolarização. Seu coração é livre para escolher. Mas, como resolver essa contradição, se meu coração é vermelho e a liberdade é azul?
O paraíso é azul e o inferno é vermelho? Por que é sempre assim? Quem inventou essa convenção?
Graças à literatura, nós vamos ao céu na companhia dos anjos, vamos ao inferno com os demônios. Retrucamos marmanjos que escrevem pandemônios. Vamos à praça, ao rio e ao mercado. À floresta, às profundezas dos oceanos e ao topo do mundo. A literatura nos leva aos confins do universo. Inclusive, por conta da literatura, somos “Bem-vindos ao inferno”.
Escrevemos, todos, deuses ou diabos, e queremos exprimir nossas opiniões, anseios monocromáticos e ideias vãs.
Escrevemos um texto, convictos de que são os deuses que escrevem. Mas o que é a convicção senão a maior inimiga da verdade? Já dizia Nietzsche. Então, contestamos... porque o vermelho é que nos emociona. Somos deuses ou diabos quando exaltamos nossa paixão colorada. Não nos importa se o vermelho é a cor do inferno, pois são os homens que denominam o que é deus e o que é diabo. A cor do céu e a cor do inferno. Então, simplesmente, escrevemos. E optamos pelo lugar onde queremos ser acolhidos.
Nesse “Bem-vindos ao inferno”, não desejamos o fogo ou as trevas para os leitores, apenas externamos nossa exacerbada paixão pelo clube do povo do sul do Brasil.
Sejam “Bem-vindos ao inferno!”.

Athos Ronaldo Miralha da Cunha
Santa Maria da Boca do Monte, 17 de dezembro de 2011