quinta-feira, 11 de junho de 2020

Don Elias

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Não tenho mais ídolos.
Todos os meus heróis ficaram na década de 70 do século passado. Tive ídolos no esporte – futebol –, e, por óbvio, atletas do Internacional.
Fora isso, tenho admiração por personalidades em outras áreas. Mas, apenas, apreço e respeito. Evidentemente, alguns deles nem apreço restou.
Na literatura, por exemplo, tem muita gente boa fazendo coisas interessantes. São dignas de merecida atenção. Na política minhas referências tornaram-se meras decepções. Um ou outro merece um pingo de admiração. Um que outro algum reconhecimento. Tornei-me um cético.
Melhor voltar ao esporte, que é o intuito desta crônica, no caso o futebol nos anos 70. Especificamente o Sport Club Internacional e um de seus maiores ídolos.
O meu primeiro ídolo foi Bibiano Pontes. Eu era um gurizote que jogava na zaga do infantil do Maneco e Pontes jogava de zagueiro no Internacional. Bibiano Pontes era o cara. Mas esta idolatria durou muito pouco, com a chegada de um certo chileno que recitava Pablo Neruda, este passou a ser o grande ídolo de uma geração de colorados que viveu sua adolescência nos anos 70 aqui no Rio Grande de São Pedro. Figueroa me ensinou a jogar com os cotovelos.  E a ser expulso do campo em várias oportunidades. Mas a lembrança mais gloriosa que temos do craque é o título de 1975. Impossível esquecer o Gol Iluminado, ano em que o Brasil fora pintado de vermelho. O time da década!
Costumo dizer que Figueroa está para a minha geração assim como D´Alessandro e Fernandão estão para a juventude que comemorou as duas Libertadores e o mundial no Japão nos anos 2000.
E por estas casualidades da vida estou num ônibus de excursão viajando de Santiago do Chile para Val Paraiso. E, claro, no meio do caminho havia um ponto de vendas de vinhos. No Chile? Não é novidade. Mas sendo a loja de Don Elias Figueroa a coisa muda “da água para o vinho” literalmente.
Para deleite dos colorados da excursão, o Figueroa estava na loja naquela tarde. Ele, a esposa e o filho.
Como escrevi, lá no início, meus heróis ficaram na adolescência num ano perdido na década de 70. E um dos meus heróis estava ali, a poucos metros. Na minha frente. E dando as boas-vindas para uma turma de brasileiros recém-chegados no Chile. 
O grupo conversou com ídolo. Batemos fotos – muitas fotos – e pegamos autógrafos nos rótulos das garrafas de vinho e em postais com a estampa do ídolo.
Toda a família Figueroa é cordial e extremamente simpática. E a impressão que tive é que Don Elias continua sendo um “coloradaço” de raiz. O cara é supergente fina. Um encontro passível de transbordar emoções. O filho do Figueroa tem a capacidade de proporcionar emoções diante do pai.
Quando me enrolei numa toalha vermelha – eu não tinha uma bandeira – e fui comemorar o título de 75 na Praça Saldanha Marinho, eu não imaginaria que após 45 anos da conquista, eu estaria proseando com o ídolo diante de uma taça de vinho. Num bate-papo informal.
Uma oportunidade única e inesquecível. Inclusive os gremistas da excursão se emocionaram.
Enfim, podemos dizer que ídolos são perenes. Claro, aqueles que sabem cultivar a idolatria. Don Elias é um desses.