Athos Ronaldo Miralha da Cunha
Todos os candidatos postulantes ao Palácio
do Planalto falaram nos seus programas em reforma política. E todos estão certos
nessa intenção. É a principal das reformas.
Abro colchetes. [Já faz algum tempo que
tramitam projetos nesse sentido no Congresso Nacional e todos os atuais candidatos
fazem parte da nossa elite política, são detentores de mandatos e não foram
capazes de encaminhar e aprovar algo semelhante. Esperamos não ser, novamente,
mais uma proposta eleitoreira]. Fecho colchetes.
A nossa democracia representativa precisa
ser rediscutida, precisamos de uma democracia mais igualitária. Uma democracia
mais espraiada na sociedade. Vejamos o período eleitoral que é o auge da participação
e onde vemos aflorar as mais diversas altercações ideológicas, religiosas e comportamentais.
E algumas excrescências, diga-se.
A nossa eleição é muito desigual. Começa
com o tempo de televisão e encerra com a capacidade de recolher contribuições. Na
corrida presidencial analisando, apenas, o G3, podemos observar que uma candidatura
arrecadou R$ 100 milhões a mais do que outra. Sem falar no latifúndio de tempo
no horário gratuito. Convenhamos, é uma corrida desigual. E para modificar esse
quadro requer uma profunda discussão. E é uma discussão polêmica e de difícil acordo,
pois envolve interesses diretos de partidos e de poder. Evidente que tem que existir uma diferença de
tratamento entre um partido com 80 deputados e outro que tem 5, mas é possível reduzir
essa diferenciação de modo que torne mais parcimoniosa e mais igualitária.
No entanto, embora o pouco espaço de mídia
e modestas contribuições têm candidaturas que consegue expor seus projetos e visão
de mundo e agregam muito mais no debate político do que longas imagens de um
país irreal ou de achincalhamento pessoais de lada a lado. Como também têm
candidaturas com o mesmo padrão de tempo de mídia e arrecadação que conseguem
mostrar o que de mais atrasado e reacionário pode existir em um pensamento. E esse
é o grande imbróglio de uma reforma: como tratar os ditos pequenos partidos? Porque
são incomparáveis as contribuições de Luciana Genro e o arremedo de candidato
Levy Fidelix, por exemplo.
Luciana Genro incorpora a candidatura
que se supera com a falta de tempo e a pouca arrecadação. Aí entra o fator ideológico
e temas intocáveis pelas “principais” candidaturas, ou seja, o fator surpresa
dessa eleição é a Luciana Genro. Entrou na campanha disposta a colocar o dedo
nas feridas e levantar as bandeiras mais polêmicas.
A candidata do PSOL trouxe para o debate
a postura de uma esquerda moderna. Uma esquerda que avança para além da
esquerda pré-muro de Berlim. Colocou na mesa temas como homofobia, maconha,
casamento homoafetivo, taxação dos bancos e imposto sobre as grandes fortunas. Discussões
que estavam tangenciando os candidatos do G3, sendo que alguns pontos sequer
estavam nos programas.
Com pouco tempo e mínimas arrecadações Luciana
Genro conseguiu fazer um estrago nessa campanha, imagina com um tempo maior e
com financiamento público. Talvez os números do Datafolha seriam diferentes.
Em 2010 Plinio fez diferente na campanha
e era um simpático candidato de esquerda, nesse 2014 coube mais uma vez a
candidatura do PSOL ser esse diferencial. Não ficamos indiferentes após cada debate,
com a participação de Luciana, em relação às suas propostas e seu desempenho.
Acredito que se os debates fossem em horário
nobre, num amplo encontro de ideias, Luciana Genro estaria como o Inter e o
Grêmio no atual campeonato brasileiro: na cola do campeão ou disputando vaga à Copa
Libertadores.
“Não levante o dedo para mim” foi a
frase que a candidata falou para Aécio Neves, o neto, quando ele replicava. Aécio
baixou o dedo e concluiu. Essa parte do debate foi breve e sem grandes
desdobramentos – não houve alteração na escala Richter –, mas foi muito
significativo.
Alguém pode perguntar: esse texto é uma declaração
de voto?
Respondo: é.
3 comentários:
Ótimo texto. Apreciei sua perspectiva e vi que ela é condizente com o que ocorreu no debate. Temos um vácuo de representação, seja por partidos que se desvirtuam, seja por regras que impedem que "a bola corra".
Grato pela leitura e comentário Roque.
Acompanho o voto do relator.
Parabéns pelo texto.
Abraço
Diego
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