Athos Ronaldo Miralha da Cunha
Estamos vivendo em tempos absurdamente democráticos.
As pessoas são intransigentes sem serem importunadas pela sua intransigência. São
mal-educadas e nada acontece e tudo fica por isso mesmo. Não há uma medida para
as palavras. Não há mediação para a divergência de ideias. Estamos a um passo de
legalizar o duelo para solucionar alguma rusga.
Algumas semanas atrás Mantega foi agredido
verbalmente em um restaurante. Posteriormente Suplicy em uma livraria também
sofreu agressões. E agora foi a vez de Chico Buarque responder por sua opinião
ou por um vídeo em que expõe o que pensa.
Leblon – o metro quadrado mais caro do Brasil – foi
o palco do barraco. Lá as pessoas são elegantes, chiques e discretas. Vivem de
rendas e passam férias em estações de esqui. Alguns têm apartamentos em Paris, Londres
e New York. São pessoas educadíssimas com formação no exterior. É assim que
nós, aqui da periferia, imaginamos o Leblon.
Mas quando o assunto é política o pau bate em
Chico.
[Não pretendo argumentar sobre o posicionamento de
Chico Buarque no que diz respeito à conjuntura brasileira. É um direito que
temos de ser contra ou a favor mesmo que não agrade a viseira ideológica de
algumas pessoas.] O fato de eu achar que o Bolsonaro merecesse uma tunda de
laço não quer dizer que quando encontrar o deputado – toc, toc, toc – eu vou
sair de relho pra cima dele. O que a neodireita ainda não percebeu é que,
independente do que ela deseja, a democracia sobreviverá.
Essa gurizada do Leblon poderia bater em Chico, mas
bater também em Castelo... Médici... Geisel... Figueiredo. Só para citar alguns
“Franciscos” que mereceriam umas porradas. Mas é o tal negócio: vamos bater em
Chico. E extravasar nossa raiva primitiva e sair cantando pneus em uma Ferrari.
Quem sabe nos próximos debates políticos os candidatos
compareçam com tacapes. E antes façam aquela encarada no melhor estilo MMA. Mas
eu ainda acho que no final vai dar tudo certo. A vitória será da democracia. E nós
continuaremos a admirar os artistas e os políticos decentes independentes do
que pensam ou deixem de pensar.
Agora me deem licença que vou abrir meu Romanée-Conti
que ninguém é de ferro. E passar a virada em meu apartamento em Cacimbinhas.
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