terça-feira, 14 de setembro de 2021

Um intelectual na política {Memórias}

Fernando Henrique Cardoso.

Confesso que folheie um dos calhamaços dos “Diários da Presidência”. Não é pra mim, pensei. Isso não é para um leitor periférico. Deixo para os historiadores do futuro vasculharem o dia-a-dia do FHC.

No entanto, quando vi esse “Um intelectual na política”, comprei. Gosto de ler memórias e narrativas em primeira pessoa. Investi uma graninha e tempo nas lembranças do ex-presidente. E devo dizer que é um bom livro. FHC esteve sempre no cerne da política e dos importantes momentos da nação. Foi exilado no Chile e morou em Paris. [Nada consta sobre o apartamento, mas já vi em outras oportunidades que ele falou que não tem apartamento em Paris].  

Esteve no maio de 68, mas só presenciou, não foi um participante das manifestações. Mas já é alguma coisa: testemunha ocular da história.

No colegial foi colega de Plinio de Arruda Sampaio, onde disputavam as medalhas de melhor aluno.

Recepcionou Sartre e Simone de Beauvoir em um jantar em sua residência. Isso me deixou introspectivo. Mas não entrei em crise existencial.

Tem uma parte dedicada ao seu sucessor na presidência. Não são muitas linhas, mas é uma revelação.

Enfim, são bons momentos de leitura sobre a nossa história recente. São 315 páginas de uma letra não muito miúda.

Ah! No final da leitura eu quase me arrependi de ter gritado “Fora, FHC!” nas praças.

Eu falei quase. Compreendido?

terça-feira, 17 de agosto de 2021

Estação Santa Maria agoniza

 

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Havia um comercial de bebida em que o bordão caiu no gosto popular. Orloff era a vodca da propaganda e personagem falava para ele mesmo: eu sou você amanhã.

Sempre que cruzo pela gare, eu penso no comercial da vodca e na antiga Soteia. O futuro da estação Santa Maria é a Soteia. Esta é a trágica e evidente constatação. Ela foi definhando ao longo do tempo e quando nos demos conta não havia mais Soteia para ser salva. Hoje, apenas escombros lá na Passo D´Areia. E a estação Santa Maria percorre o mesmo caminho. A Soteia é a estação amanhã.

Certa feita, lá em meados da década de 90 do século passado, bati umas fotos. A plataforma estava coberta e intacta. Havia o sino e o relógio. Naquele dia seria impensável imaginar o estágio de degradação vinte e poucos anos após.

Neste quarto de século passaram vários prefeitos dos mais variados matizes ideológicos e a estação Santa Maria estava lá, agonizando a espera de ajuda. O descaso foi completo. E a fatura chega em doses homeopáticas.

Santiago, Bagé, Cacequi, Dom Pedrito, Santo Ângelo e Restinga Seca são exemplos de estações preservadas. Bem que a estação Santa Maria poderia ser uma delas amanhã. Mas a estação Santa Maria será a Soteia. Esse é o roteiro de um filme de terror.

A estação Santa Maria é o local que mais fotografei aqui na cidade. E o sentimento de tristeza dispara quando comparamos as fotografias com o passar dos anos.

Aí lembro de Heráclito e o rio. E devo dizer que não visitamos duas vezes a mesma estação Santa Maria. Nós não seremos mais os mesmos, mas muito mais evidente é que a estação também não será mais a mesma. A velha estação definha... a cada visita um adeus. A cada visita temos menos estação. A cada visita nos aproximamos mais do fim da película.

A estação Santa Maria pede socorro!

Sou filho e neto de ferroviário. Então, sou saudosista dos áureos tempos da Viação Férrea. O trem da Fronteira, o Minuano e o Húngaro. Nos países desenvolvidos o transporte ferroviário é uma certeza. E o Brasil precisa retomar este tipo de transporte público. Ainda desejo rever um trem de passageiros ligando Uruguaiana a Porto Alegre. E que Santa Maria volte a ser um entroncamento ferroviário.

A revitalização da nossa gare é um sonho antigo. Mas a gare está, literalmente, sem rumo. E encaminha-se rumo às ruínas. E amanhã será, apenas, um lamento.

Pau Brasil

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

 

Nestes tempos de agressão ao meio ambiente e descaso com a floresta amazônica, seria plausível falarmos da árvore símbolo do pais: Pau Brasil.

Inclusive, tem um exemplar dessa árvore na praça Saldanha Marinho. Eu sempre achei meio estranho esse nome, algo meio fálico. E hoje eu lembrei quando li a notícia de que um deputado federal usou dinheiro público para fazer uma prótese peniana. Vamos combinar, né. Tem tu a ver com pau Brasil.

Por que o espanto?

O nobre edil deve estar armado para ferrar com o povo, ora. E também deve estar ereto para enfrentar a pauleira que é cada sessão na câmara. Mesmo porque, em algum momento, o deputado pode chutar o pau da barraca.

Como são 513 parlamentares e mais 81 senadores, penso que deveria ser feito um edital para concorrência pública.

A presidência de cada casa deveria passar uma lista aos interessados em participar e constar no edital o nome do interessado e as características do implante. Sem sombra de dúvidas, seria mais transparente e menos oneroso para o erário.

Se uma prótese custou 55 paus. Imagino que 100 ou sei lá... 200 próteses, custaria bem menos. Ficaria bem mais em conta. Dinheiro público tem que ser tratado com a máxima transparência.

Ah! O congresso deveria criar um saite especifico para acompanhamento pelos cidadãos e cidadãs.

A “transparenciapaubrasil”. Tudo minúsculo e sem acento.

Claro, em homenagem a árvore símbolo do país.

 

ps.

Contém ironia. Aliás, só ironia.


 

segunda-feira, 26 de julho de 2021

Cronologia da 2ªdona

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

 

O time perde no jogo de estreia. Mas como era um confronto fora de casa, não damos a mínima. Não contávamos com esse ponto e, afinal, são 38 rodadas e é só o começo.

Mais alguns jogos e o time perde e empata e ficamos indiferentes. Tem muito campeonato pela frente e nossa equipe é boa. Só falta engrenar. O time é bom e o técnico é supercampeão.  

Na décima quinta rodada o time ganha de um timeco de quinta que também está no Z4. Mas nosso time continua na zona do rebaixamento. Continuamos convictos, pois falta um pouco mais de pegada dos jogadores. Culpamos os gramados horríveis. E continuamos acreditando que nosso time é bom. Mas não saímos da zona. Inclusive, vislumbramos vaga para a Libertadores. O presidente vem a público dar total apoio ao treinador.

Mais umas rodadas e o time não encaixa vitórias. E continua no Z4. Trocamos o técnico, contratamos um ex-jogador que deu a vida pelo clube no passado. Ele tem estrela e história. E, além do mais, só depende de nós para sair da zona do rebaixamento. Agora rebaixamos nosso horizonte americano. Podemos conseguir, tranquilamente, vaga para a Sul-Americana. Repatriamos um centroavante da Europa com 39 anos. E colocamos nele todas as nossas fichas. Agora vai. A torcida assiste aos jogos ajoelhada e acende velas.  

Na vigésima oitava rodada o time continua no Z4. Mas basta conseguir uma sequência de vitórias que a gente sai dessa posição incômoda. Precisamos ficar na 16ª colocação e, afinal de contas, time grande não cai. Derrubamos novamente o técnico e entra o treinador da base.  

Mais duas ou três rodadas e já não dependemos de nós mesmos para escapar da zona. Precisamos de vitória de alguns e derrotas de outros para sairmos do Z4. Série B é a realidade. Agora caiu a ficha. E xingamos os dirigentes, treinador substituto, jornalistas esportivos, jogadores mercenários, torcida cola-fina e depredamos o estádio.

Faltando quatro rodadas e só um milagre nos salva da segundona. Conjunção de planetas, quartos de luas e reza da mãe Joana.

Mas às 20h, no final de um jogo derradeiro, já não temos mais salvação. A série B é uma realidade. Choram jogadores ao final do jogo e torcida diante da televisão.

Bueno. E como faz para não cair? É só não seguir essa cronologia.

sábado, 24 de julho de 2021

Faixa vermelha

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

 

Já faz algum tempo, muito tempo, mas eu fui praticante de Taekwondo e cheguei até a faixa vermelha... ponta preta.

Treinávamos no subsolo da USE – União Santa-Mariense de Estudantes – um prédio inacabado na rua do Acampamento e tínhamos como instrutor um coreano chamado Mestre Kim. Kim lá na Coreia deve ser algo como o Silva aqui no Brasil. Naquele tempo ele era o cara. Se autointitulava faixa preta 6º dan. Também aprendi a manejar o nunchaku. Eu mesmo fiz o meu com um cabo de vassoura.

Traduzindo tudo isso aí em cima: eu era metido, mas não era afoito. Nas saídas do DCE ou de um cineminha eu voltava a pé para casa, sem antes comer um Xis no Tareko em frente ao Hospital de Caridade. Mas caminhar pela Fernando Ferrari à noite no final dos anos 70, início dos 80, não era para qualquer um. Era uma rua – na prática ainda não era avenida – mal iluminada e sem calçamento. Voltava sempre desejoso que algum incauto viesse me assaltar. Eu sentia uma pena antecipada do assaltante. Naqueles tempos não havia a recomendação de não reagir a assaltos. Mas nunca ocorreu. Aliás, nunca utilizei minhas habilidades nas artes marciais fora da sala de treinamento. Uma vez lá na Mata – num fim de baile –, um gaúcho macho fez uma “gracinha” para uma amiga e quase me tirou do sério. Mas a turma do “deixa disso” acalmou os ânimos.

Com essa onda de insegurança que assola nossas cidades nos dias de hoje, eu sinto falta daquela autossuficiência que tinha para resolver alguma pendenga.

Hoje, nem pra faixa transparente eu sirvo. Na semana passada fui mostrar meus conhecimentos com o nunchaku e arrumei um galo na testa.

Enfim, meu coração é vermelho palpitante e já fui faixa vermelha. E para chegar na faixa vermelha tem que passar pela amarela e pela verde. A minha “vermelhice” é política, esportiva e etílica e vem de longe: desde 1909.

terça-feira, 20 de julho de 2021

O gosto do brasileiro

Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Até o ano passado os brasileiros adoravam e assistiam, dominicalmente, às corridas de Fórmula 1.

Adoravam a Libertadores e a Copa América. A Copa América, então, era um desafio e tanto. Acirrava as nossas profundas divergências com os argentinos. Inclusive, divergências que a gente nem sabia que tinha.

– Como é bom ganhar da Argentina! – exaltava o narrador.

Bueno, era assim que nos portávamos diante desses torneios. Fanáticos, com fé e ira esportiva. Dava gosto de ver como torcíamos. E retorcíamos.

Esse ano tudo mudou. Como por encanto não gostamos mais da Copa América e a Libertadores passa quase “a lo largo” da nossa televisão.

Agora nós adoramos a Eurocopa. Aquilo, sim, é que é torneio. Só jogão. Outro nível.

Nós, brasileiros, desdenhamos a nossa medíocre Copinha e damos vivas a copa dos nossos colonizadores. Viva a Eurocopa!

Já aproveito a oportunidade e aviso que a Champions League nós também não vamos gostar. É mais ou menos a mesma turma da Eurocopa, mas não é para o nosso bico.

 

A última vez que assisti a uma corrida de Fórmula 1 foi há 27 anos. A fatídica corrida em que faleceu Ayrton Senna. Faz algum tempinho. Mas hoje resolvi assistir às voltas finais do circuito de Silverstone.

Lewis Hamilton venceu e o Walter, que correu de botas, chegou em terceiro. Se tivesse usado alpargatas teria melhor performance. A propósito: sou zero em avaliar esse esporte. Só curto o ronco dos motores.

 

Ainda hoje vou assistir aos jogos do Brasileirão. O do Inter, é claro. Esse campeonato, os brasileiros ainda gostam, mas não sei se por muito tempo. O gosto do brasileiro anda muito estranho.

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[Aos desavisados: contém ironia... muita ironia].