Athos Ronaldo
Miralha da Cunha
“Imagine um mundo vazio.”
É com essa frase que começa a vinheta de
Ano-Novo da Globo News. Um trabalho profissional e com o padrão Globo de
qualidade. Invoca nossos sentimentos de solidariedade, de luta, consciência ecológica
e externa um desejo de paz entres os humanos. Poesia na tela com imagens e
frases lapidadas.
Mas o conteúdo me surpreendeu. Eu fiquei
incomodado diante das referências, das imagens utilizadas. Não que as imagens
tenham donos, mas algumas simbolizam uma visão de mundo, um modelo social e
econômico não apregoado pela Globo. Algo que escapa aos ideais dessa empresa. Sons
e representações não condizentes com o histórico da Rede Globo de Televisão. É
nesse ponto que eu queria chegar, na apropriação de uma causa, na utilização de
uma bandeira que não era a sua. Hoje, a conjuntura permite. A direita se
apropria de um legado que a esquerda, de certa forma, relegou, ou deixou em stand by. Pode ser o reflexo do que, certa feita, falou
um ministro: devemos rebaixar nosso horizonte utópico. Conjecturas...
Diante dessas mudanças eu não me
surpreenderia se numa próxima novela das 9 a Globo usar a estampa de Che Guevara na
abertura. – Salve Che!
Talvez passe desapercebida, mas me causa
desconforto a Globo News usando imagens de punhos cerrados, de flores nos canos
de fuzil, a estampa de Guevara simbolizando sonhos e uma utopia solidária,
daquele arame farpado que simbolizava a resistência. Há tempos – final da
década de 70 – tivemos uma chapa para o DCE da UFSM que o símbolo era duas mãos
abrindo uma cerca de arame farpado. Era tempos de confrontos, uma luta desigual
que provocou centenas de desaparecidos e que rogamos uma discussão acerca
desses arquivos ainda plenamente guardados. Mas isso é outro assunto.
A vinheta é muito bonita. Um trabalho de
arte sem igual, mas com esse senão. Até que ponto uma empresa do porte da Globo
pode se apoderar de um ideal? Como a Globo se apropria de um sonho? Che numa
vinheta institucional da Globo... fere a memória do guerrilheiro e o passado de
muita gente que hoje não está nem aí. E, talvez, seja essa a causa, muitos dos
que levantaram as bandeiras não estão nem aí.
Se eu esqueci uma bandeira em alguma
calçada ou avenida de um passado nem tão distante, alguém pode pegar e sair desfraldando
como sendo sua. Aí teremos que correr atrás. Mas é mais aprazível o conforto do
ar condicionado do que o vapor das ruas.
Outro dia numa propaganda de uma
multinacional de bebidas falaram em “preço justo”. E nós sabemos que o preço
justo é praticado no cooperativismo e não numa empresa que visa a maximização
do lucro. É o capitalismo se remodelando nos mais variados segmentos. Mas a
resposta não está na Globo. A resposta está na esquerda que não solidificou devidamente
o que era sua propriedade e deixou escapar por entre os dedos de um punho
cerrado. Por entre as palavras de ordem na multidão. Por entre as passadas de
quem caminhava e cantava. Enfim, não somos mais os mesmos... acho que é isso.
A vinheta encerra com a frase “saber é
poder”. E nesse janeiro começa um dos programas com maior audiência da Globo, o
BBB13. Afinal, saber é poder.
Tudo muito bonito. Tudo muito legal.
Mas...
Em que lado estava a Rede Globo no
período da ditadura?
3 comentários:
Pois é, meu amigo, as imagens e as palavras vão ganhando novos significados. Como disseste, o mundo capitalista vai se remodelando. É por isso que se mantem, não é mesmo?
Mesmo assim, boa - e amargurada, claro - reflexão.
A impressão que passa é que a esquerda não consegue fazer uma reflexão e, muito menos, uma autocrítica.
Ao contrário da direita que vai remodelando o discurso.
Atualmente há uma exacerbada disputa, uma grenalização da politica, pois ninguém cede e o que vale é colocar os podres dos adversários. Cada lado coloca os podres dos outros e o que passa para o cidadão comum é de que são todos iguais... e isso é preocupante.
por favor postem o vídeo acho muito lindo e gostaria de compartilhar!!!
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