Athos Ronaldo Miralha da Cunha
Uma caminhada pela orla de Copacabana é
tudo de bom num final de tarde no Rio. O sol e as cariocas são fascinantes. Mas
naquela tarde quente resolvi caminhar até a estátua de Tom Jobim e o percurso ficou
mais longo e na volta anoitecia na cidade maravilhosa. O movimento continuava
intenso de passantes e turistas, mas um pouco antes de chegar ao hotel recebo o
que todo carioca já está acostumado e todo turista teme.
– Isso é um assalto, mermão! Passa a grana.
Quatro musculosos e brabos cariocas e uma
beldade de longos cabelos me interpelam e me arrastam para a penumbra de uma árvore
próxima a estátua de Ibraim Sued, perto do Copacabana Palace.
Não me perguntem como, mas eu consegui uma
tornozeleira eletrônica antes de viajar em férias para o Rio. Claro, nas minhas
caminhadas pelas praias de Copacabana e Ipanema sempre tomava o cuidado de colocá-la
camuflada pela meia soquete. Pedi calma para os simpáticos recepcionistas cariocas
e mostrei a tornozeleira aos meus novos amigos.
– Tchê! Tamo junto, mano! – falei triunfal.
Não era para ter saído o tchê. Fazer o quê.
– Ô gaúcho, tu é dos nossos?
Também estava com uma guaiaca e nas costas
trazia uma faca de prata. Herança do sogro. Quando puxei a faca houve um espanto
geral e uma abertura da roda. Os olhos branquearam na faca.
– Calma aí, gaúcho.
Então, expliquei que a faca já tinha feito
muito serviço. A guria se interessou o porquê da tornozeleira eletrônica e como
eu estava no Rio. Não deveria cumprir pena no Sul? Falei que estava sendo
transferido para uma cela especial no Rio – presídio de segurança máxima, cela
solitária – e antes de desocupar a minha, me colocaram aquela tornozeleira. Acho
que pegou. Eles, apenas, se entreolharam. Então me apresentei.
– Paulinho Torquemada, a seu dispor. O mais
cruel do morro do Alemão.
– Sem essa, no morro do Alemão não existe nenhum
Paulinho Torquemada – falou com os olhos vidrados na tornozeleira.
– Do morro do Alemão em Porto Alegre –
falei, e mais uma vez colou.
A jovem carioca resolveu que queria saber
sobre meus crimes.
Latrocínio, estupro – ela também arregalou os
olhos – homicídios, três, sendo um deles triplamente qualificado. Eu sempre
gostei da expressão triplamente qualificado, o cara fica num nível mais acima
dos demais.
Nesse momento eu senti um malestar entre os
meus novos amigos. Um deles falou “Bah!” e eu tive que rir.
E para arrematar eu perguntei se eles
lembravam quando os gaúchos queimaram o relógio dos 500 anos. Fizeram, apenas,
que sim com a cabeça. Pois é, eu era estudante naquela época, foi a minha prova
de fogo. Dali para os furtos e assassinatos foi um pulo. Percebi que a jovem já
me olhava com uma certa admiração, então resolvi dar um tchauzinho aos meus
amigos.
– Vamos marcar um chope amanhã nessa mesma
hora. Aqui por essas bandas.
– Pode crê, mano.
Terminei minha caminhada... tranquilamente.
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