segunda-feira, 24 de junho de 2013

La garantía soy yo



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Com as ruas em polvorosa e o país diante de inúmeras incertezas, pipocaram as mais diversas teorias.
As teorias conspirativas tinham vários nomes de grupos dispostos a assaltar o poder. Anonymous – com aquela carinha sarcástica – era o primeiro da lista, mas vinham a reboque os velhos e tradicionais “istas” de nossa história: fascistas, nazistas, integralistas, comunistas, anarquistas, socialistas, internacionalistas e mais um que chegou em grande estilo e dono do pedaço, os “apartidaristas”. Inclusive, alguns teóricos acordaram agora, outro nunca dormiram e os mais antigos estavam sesteando. E todos com suas razões entre um bocejo e outro.
Com essa possível ou improvável iminência de uma revolução ou golpe, ou quartelada, resolvi consultar meus alfarrábios sobre teoria política. Me lembrei que, certa feita, um cara havia previsto a data e hora da revolução, mas não tinha certeza se era pra já.
Consultei alguns escritos de Karl Marx, algumas teses de Vladimir Lenin, artigos de Leon Trotsky e alguma coisa de Groucho Marx, Aparício Torelly e Stanislaw Ponte Preta. Como também fiz uma releitura das premissas de guerrilha de Mano Lima. Claro, as teses de uma revolução chique de Gloria Kalil.
Não achei nada nas teses que indicassem um estado pré-revolucionário ou golpista. Para haver um golpe de direita a elite tem que estar descontente, não é o caso, a elite vai muito bem, obrigado. Para haver uma revolução de esquerda, a esquerda tem que derrubar o governante, mas nesse caso o governante é de esquerda... aí embrulha as ideias e os ideais.
A única descoberta que consegui fazer foi de que um grupo internacional de massagistas revolucionários unificou a pauta de reivindicações, para esses protestos, com as telefonistas da social democracia.   
Então, resolvi consultar a Mãe Menininha do Canto A, B, C e D e nada de golpe ou evolução. Fui visitar o sindicato dos metalúrgicos do A, B, C e D – centro de reivindicações em épocas passadas – e, novamente, nenhum indício de golpe ou revolução. Diante de todos esses porquês concluí que não há motivos para preocupação de golpe, revolução, quartelada, insurreição, intentona e assunção do que quer que seja.
– Quem me garante que não haverá um golpe? – alguém pode perguntar. E eu respondo.
– La garantia soy yo.

domingo, 23 de junho de 2013

O pronunciamento de Wanda



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Após o início das manifestações pelas ruas e praças do país, os brasileiros aguardavam, ansiosos, o pronunciamento da presidente. E depois de algumas reuniões foi anunciado o esperado discurso.
E como de praxe, cada brasileiro fez a sua análise e os palpites e pitacos pipocaram web afora. Para não fugir a regra... vamos lá.
Os dez minutos de conversa eu reduzo em duas frases, que, na minha opinião, são importantes e fundamentais para o momento em que vivemos.
1º. O comentário sobre a “importação” de médicos do exterior.  Não faria falta no discurso porque “importação” de médicos não é uma solução e, sim, um paliativo. E a categoria deveria ter sido ouvida. Mas a presidente resolveu colocar e isso só fomenta a discussão em um momento tenso.
2º. A presidente afirmou que iria convidar os presidentes dos demais poderes – Legislativo e Judiciário – para uma reunião. A grande e expressiva frase do discurso de Wanda. E esse anúncio é de fundamental importância. E que deveria ser objeto de análise e cobrança futura, mas no meio do pronunciamento, passou meio despercebido e escapou de uma avaliação mais atenta.
Todos lemos um post que circula na internet que esclarece os poderes da presidência da república. E que diz o que a presidente Dilma pode e o que ela não pode, porque algumas reivindicações são atribuições dos demais poderes.
A Dilma não prende. A Dilma não cassa deputados. A Dilma não veta emenda constitucional. A Dilma não elege o presidente do senado. A Dilma não instaura CPI. Claro que a presidente Dilma não tem os referidos poderes citados. Mas não sejamos ingênuos. A presidente Dilma articula e tem poderes para isso, e a opinião e o desejo dela têm o peso e a procuração de 56 milhões de votos.
Então, a Wanda que esteve nas ruas, em outros tempos, para protestar por liberdade e democracia, agora como presidente Dilma terá a sensibilidade de ouvir o ruído dessas mesmas ruas e interpretá-los. E, na minha opinião, o primeiro passo foi dado ao solicitar a reunião com os demais poderes.
Assim, aguardemos o desfecho dessa reunião e os encaminhamentos que dela sairão. Vamos ver o que dizem e o que farão os demais próceres da nossa república. Qual será a resposta a esse clamor.
Quando termina uma partida de futebol, os jogadores e o técnico fazem uma entrevista coletiva para analisar a partida e explicar aos torcedores os erros e acertos. E assistimos com a devida atenção essas análises. Depois, ainda, assistimos aos programas esportivos que debatem o jogo, os jogadores e as análises. E também debatemos.
Dada a relevância histórica do atual momento, não seria interessante uma entrevista coletiva dos jogadores, técnicos e presidentes dos clubes “Sport Club Senado”, “Associação Câmara de Futebol”, “Judiciário Esporte Clube” e “Executivo Futebol Clube”? Seria importante ouvirmos para acreditar que alguma coisa possa ser diferente daqui para frente.
Se a Fifa permitir, é claro.

terça-feira, 18 de junho de 2013

A terceira Lei de Newton e os Vândalos



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Tudo estava pronto para o Brasil mostrar ao mundo os preparativos para a Copa de 2014 com a pré-Copa 2013. Tudo muito lindo. Tudo muito legal.
Mas o raio de R$ 0,20 no aumento das passagens de ônibus em São Paulo desencadeou uma onda de protestos que foram e estão sendo muito além do jardim dos vinte centavos. O país virou notícia no mundo afora e os manifestantes ganharam apoio dos mais diversos lugares do planeta.
É um movimento ainda passível de uma análise mais profunda, inclusive, a grande mídia titubeou no começo, pois quem buscou ou recebeu informação apenas pelos canais da Rede Globo & Cia ficou com uma meia verdade ou uma mentira por inteira. Posteriormente, foram mais jornalistas com episódio. No entanto, as informações e toda a articulação foram via Twitter e Faceboock. Pela internet as notícias das manifestações foram mais reais e mais ágeis. Um jornalismo com a cara do povo e aí, sim, com versões e aversões das mais diversas espécies. O Jornal Nacional foi pautado pelas mídias sociais. E a palavra vandalismo foi mais comedida nos jornais seguintes da Globo.
Li e vi muito nesses dias. O grau de informação é intenso e numa velocidade espantosa.
Sobre as vaias no Mané Garrincha, não desqualifico quem vaiou. A classe média faz parte do estrato social que, historicamente, paga essa conta. E a esquerda – berço das manifestações de massa de tempos não tão remotos – também é oriunda dessa classe média. E a vaia não foi 100%, afinal uma parte da esquerda que está no governo também estava presente no estádio. Mas a frase que mais sintetiza as vaias à Dilma foi expressa por Roberto Requião “As vaias foram para toda a classe política”. E é essa a impressão que temos.
Quando avaliamos essa manifestação corremos o risco de avaliar olhando para trás, e conjecturamos como eram feitas as mobilizações de 20 ou 30 anos. Naqueles tempos tínhamos um partido que liderava os trabalhadores, uma central sindical que nasceu para ser a maior central da América e uma união de estudantes com um tremendo histórico de lutas. Na campanha das “Diretas já” e do “Fora Collor” houve uma união de todos os partidos e segmentos populares nesse sentido. Inclusive, alguns conservadores pularam nessa embarcação, pois vislumbravam novos ventos e a “boquinha” estava a perigo. E eles continuam presentes até hoje nos escalões do executivo. E isso merece outra reflexão.
Essas manifestações não trazem em seu bojo um partido, uma central ou uma união de estudantes e isso intriga os pensadores, analistas e próceres conhecedores da vida política do Brasil. Esses manifestantes marcam um ponto de virada no modo de fazer protesto. Dizem que a eleição de Obama teve fundamental importância nas redes sociais. Pois bem, ela chegou ao Brasil.
Tem um chavão que diz “não existe vazio na política”. Podemos estender que não existe vazio nas manifestações de massa, só que esse vazio demora um pouco mais para ser ocupado. A CUT, o PT e a UNE negligenciaram nesse sentido e deixaram esse vazio, se essas entidades não foram capazes de se renovarem e foram completamente ausentes enfraquecendo as mobilizações nos últimos 10 anos, hoje a conta está nas praças e avenidas e sem as bandeiras históricas do PT, da CUT e da UNE. Um preço que ainda não sabemos quantificar.
Na posse da direção da CUT o então presidente Lula falou que os movimentos sociais deveriam pressionar o governo. Mas a direção da CUT não entendeu ou fez de conta que não entendeu e ficou estática.
Com quem negociar? – perguntam governadores e prefeitos se não tem uma liderança, um partido, uma central na liderança desse movimento. Simples. Negociarão com uma nova geração de líderes, de ativistas que está se formando à margem das entidades tradicionais. E isso é bom a para a democracia e péssimo para os atuais conservadores.  
Não existe nada mais conservador, tradicional, reacionário do que criticar as manifestações e protestos populares. Quando leio algo nesse sentido, eu lembro do general Figueiredo saindo no tapa com estudantes em Florianópolis, o Collor fazendo o sinal com o dedo médio para a população e de um arremedo de político de Santa Cruz do Sul afirmando que estava se lixando para o povo.
Povo na rua é sinônimo de democracia e de liberdade.
Mas o que leva essa multidão às praças? Claro que não foram os vinte centavos. Se não temos um “grande líder”, uma “grande causa” temos o quê, então? Temos um descontentamento geral com os políticos e governantes por conta da impunidade, da corrupção, dos gastos indiscriminados, pela falta de saúde e segurança.
Também temos algo imaterial, algo intangível, mas de suma importância para vivermos – e que para uma geração de lutadores foi o principal ideário nas manifestações de outrora – temos um acúmulo reprimido de esperanças e utopias rebaixadas. Temos um punhado de sonhos jogados no lixo. E essa bolha tinha que estourar. E foi, apenas, por conta de um estopim de 20 centavos.
Então, essas manifestações desse início de década é uma força que nos escapa e que ainda não conseguimos apalpar.
Bueno, sobre a terceira lei de Newton também conhecida como princípio da Ação e Reação diz “a toda ação corresponde a uma reação de igual intensidade, mesma direção e sentido contrário”.
Então, a reação explicitada nas manifestações está correspondendo a uma ação de corrupção, impunidade, descaso, desvio de verbas, politicagem, falta de políticas públicas etc, etc, etc, etc...
E achamos exagerado? Será?