segunda-feira, 30 de abril de 2012

O mais fanático


Athos Ronaldo Miralha da Cunha

O Sport Club Internacional tem proporcionado muitas reflexões acerca da paixão pelo futebol e por um clube.
Nessa exacerbada idolatria estão as vitórias, conquistas, gols espetaculares – outros, apenas, inesquecíveis – e heróis que marcaram épocas. Mas no bojo dessa paixão também está a saudade.  E essa saudade está nas ocasiões mais singelas de um torcedor. Um jogo no Beira-Rio, num bar com amigos ou em casa com familiares é motivo para nos colocar em êxtase. E podem aflorar a saudade de um título. Saudade dos que tinham a mesma paixão e já não estão mais aqui porque torcem em um plano diferente.
Quem não sente saudade daquela manhã de domingo 17 de dezembro de 2006? Um dia ensolarado em todos os campos do Rio Grande do Sul em que a nação alvirrubra comemorou apaixonadamente a conquista do mundial. O dia em que a Terra foi debochadamente pichada de vermelho.
Essa paixão pelo Colorado vem de longe. Não é ao acaso. E perfeitamente explicável por que é familiar. Evidente que é uma herança de pai para filho desde 1909. Lembro que lá pelos idos de 68 o seu Anísio Cunha ouvia os jogos do Colorado – torneio Roberto Gomes Pedrosa, o Robertão – num antigo rádio. Enfumaçava a casa toda, pois o velho era um fanático e fumante torcedor do Internacional. Ainda posso vê-lo sentado próximo ao rádio, fumando e nervoso com a narração do Pedro Carneiro Pereira. O rádio era todo marcado com as pontas dos vários cigarros pitados durante os jogos.
Do velho Anísio Cunha – fanático, fumante e mateador – eu herdei o fanatismo pelo Internacional, uma ojeriza ao cigarro e um chimarrão bem gaudério para acompanhar os jogos do colorado dos pampas. Em algumas situações eu incremento com melissa ou erva-cidreira dependendo da importância do jogo.
Muito tempo depois já com uma televisão preto e branco víamos os jogos, mas ouvíamos pelo rádio. Se continuasse com esse hábito estaria livre do Galvão Bueno e do Renato Marsiglia. Mas, fatalmente, cairia na narração do Pedro Ernesto. Convenhamos, os jogos pelo rádio são mais emocionantes. No rádio o jogo é mais corrido. As palpitações acompanham o estado de espirito do narrador. E, assim, vai se formando o torcedor, o fanatismo, a paixão. E a taquicardia antes, durante e depois dos jogos.
Certa a feita dona Rita – que não ouvia e nem assistia aos jogos – falou que sabia quando o Inter era derrotado ou ganhava uma partida.
– Se o Anísio desliga o rádio logo após o final do jogo é porque o Colorado perdeu. Se fica escutando os comentários, entrevistas e repetição dos gols noite adentro é porque o Inter ganhou.
Tenho a impressão que a genética explica algumas atitudes herdadas. Aqui em casa – nos dias de vitória do Inter –, assistimos Bate-Bola, Sportv, gols do Fantástico, placar da rodada e o que mais tiver em qualquer “radiozinha” que seja possível sintonizar pelo interior guasca. Em tarde de derrota eu fico distante da televisão e do rádio. Curo minha chateação lendo um livro. Na maioria desses dias eu sempre recomeço a leitura de Ulisses de James Joyce. O poder de Joyce de não curar uma cabeça inchada é impressionante.
Enfim, para ser um torcedor, com T maiúsculo, alguém deve ter sido mais fanático em sua vida. O torcedor número Um. No meu caso o velho Anísio Cunha.

domingo, 29 de abril de 2012

Chapa 3 e o Costão do Santinho


Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Mais uma vez estamos diante de uma eleição para o Conselho da Funcef.
E, novamente, teremos em mãos as propostas e as carinhas sorridentes dos pretendentes aos cargos. Mas alguns desses sorrisos não nos enganam mais e nem nos iludem com falsas promessas.
Mas nós temos que acreditar nas pessoas, que temos colegas com reais propósitos de tornar nossa Funcef mais transparente, menos discriminatória e, inclusive, mais democrática nas decisões.
Nesse sentido vejo que os candidatos pela chapa 3 são os que mais se aproximam da minha visão de Funcef. São esses colegas que poderão propor a mudança, algo novo e que poderão equilibrar um jogo extremamente desigual. Esses colegas poderão contrapor à mesmice. Os colegas que compõem a chapa 3 poderão inserir uma paridade dos planos de benefícios dentro da representação no conselho, pois atualmente essa paridade inexiste.
Imagino que todos que se propuseram a essa empreitada tem reais motivos e são cheios de boas intenções, mas como diz o proverbio: de boas intenções...
Precisamos do novo. Do que desconcentra. Do que contradiz. Precisamos de atitudes e ações espraiadas pelas unidades da Caixa.
Sendo sócio da Funcef eu sou dono de aeroportos, hotéis, resorts e, inclusive, da usina hidrelétrica de Belo Monte. Eu gostaria muito de saber como são essas negociações e avaliações de investimentos. E uma tentativa de ter essas respostas é elegendo os colegas da chapa 3. Esse será o meu voto. Um voto que não prejudica a aposentadoria.
Agora, com licença que eu vou passar o fim de semana no Costão do Santinho. Volto para votar.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Hoje eu acordei em 75


Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Hoje eu acordei em 75. Mais precisamente no dia 7 de dezembro.
É um tempo distante – um tempo que na política queremos esquecer –, mas que no futebol foi inesquecível para a nação alvirrubra. O Internacional conquistou o primeiro campeonato brasileiro com o memorável Gol Iluminado de Dom Elias Figueroa. Manga entrou para a história como um dos melhores goleiros que jogou no Beira-Rio pelas milagrosas defesas na decisão contra o Cruzeiro. Vitória que pavimentou, naquele ano de 1975, os campeonatos de 76 e o invicto de 79.
Quando acordei em 75 o dia amanheceu ensolarado. Os colorados estavam radiantes e confiantes com a equipe liderada por um chileno que recitava Pablo Neruda, jogava bem com os pés e com os... cotovelos para desespero dos atacantes.
Estava com 15 anos bem vividos, cursava o primeiro ano do segundo grau no Maneco e morava num chalezinho na rua Felippe D´Oliveira. Nos finais de tarde jogava bola com a gurizada da rua num campinho em frente de casa. Hoje, o antigo campinho das peladas e gols estufando redes imaginárias é um edifício de apartamentos. Eram outros tempos e o futebol um pouco diferente. Mais arte e menos força. Mais camiseta e menos grana na conta dos boleiros. Os craques faziam carreiras nos times e jogavam por longos anos.
É impossível não lembrar os craques da década de 70 – o melhor time da década – nomes que estão gravados na memória dos torcedores: Manga, Claudio, Figueroa, Marinho e Vacaria. Falcão, Caçapava e Paulo Cesar. Valdomiro, Flavio e Lula. Benitez, Batista, Dario, Escurinho e o Príncipe Jajá. E tantos mais que alegram a memória dessa imensa torcida.
Naquele longínquo 07.12.1975 o interesse e apreensão dos colorados estava no estádio Maracanã. Jogaram pelas semifinais do brasileirão Fluminense x Internacional. E, como sabemos, também foi uma memorável vitória. Um dois a zero – com gols de Lula e Paulo Cesar – para lavar a alma pampiana dos maragatos. Segundo uns mais afoitos aquele resultado foi o segundo Maracanaço da história. 
Impossível esquecer a triangulação fatal de Vacaria, Paulo Cesar – que ainda não era Carpergiani – e Lula naqueles anos dourados que culminaram com o tricampeonato em de 79.
Hoje eu acordei em 75 é e muito bom saber que vamos ganhar do Fluminense. Muito bom saber que o Maracanã vai silenciar diante do Internacional.
Enfim, se eu acordar no dia 10.05.2012, que silencie o Engenhão. 

domingo, 1 de abril de 2012

A ditamole


Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Não faz muito tempo em editorial, o jornal Folha de São Paulo insultou a memória de todos aqueles que lutaram, e muitos perderam a vida, pela redemocratização do Brasil. Um editorial arrogante, pois, inclusive, tiveram a audácia de usar um neologismo ditabranda para reduzir as consequências da ditadura militar no período de 1964 a 1985.
Quem de nós não conhece um companheiro ou filho ou neto de um bravo brasileiro descendente dos anos de chumbo. Quem não conhece os relatos dos cárceres da ditadura. Nós não renegamos a morte de Lamarca, Marighela, Fiel Filho e um sem fim de lutadores.
Aquele editorial da Folha de São Paulo soou como um deboche, um escárnio para quem leu minimamente qualquer livro desse período. Daqui a algum tempo teremos classificações para as ditaduras: a ditalíquida, ditamole, ditabranda e a ditadura. Conforme o número de mortes e desaparecidos serão enquadrados em cada categoria. Assim, em uma honorável reunião de ditadores, sob o tilintar de cálices de cristal, poderemos ouvir comentários como: minha ditabranda só assassinou 5 mil guerrilheiros. A tua matou muito mais. Mas, mesmo assim, eu sou teu fã. A minha é uma ditalíquida, eu só estou há quarenta no poder.
Se não fosse lúgubre seria hilário. Então, meus caros, escolham a sua dita. É vergonhoso para quem se diz humano, racional e um sobrevivente cidadão do século XXI.
No Brasil não temos punidos. Mas temos benesses para quem provar que foi perseguido, preso e torturado. Como se uma pensão sepultasse as sequelas dos cárceres e do ódio dos torturadores. Até hoje tem brasileiros que não dormem porque estão sempre na expectativa de uma botina na porta e um fuzil na cabeça.
O Brasil, ao contrário de outros países da América Latina, recusa-se abrir esses arquivos. Não me surpreenderia se num futuro estaremos dando vivas ao general Medice. A ditadura militar brasileira ainda está no subsolo dos bem-guardados arquivos e longe dos livros de história. Esse silêncio todo me atordoa – verso de Chico Buarque – Cálice.
Viva a ditabranda – e cale-se – nossas cicatrizes não serão mais as mesmas. É mole?