quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

O pau que bate em Chico às vezes não bate em Francisco



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Estamos vivendo em tempos absurdamente democráticos. As pessoas são intransigentes sem serem importunadas pela sua intransigência. São mal-educadas e nada acontece e tudo fica por isso mesmo. Não há uma medida para as palavras. Não há mediação para a divergência de ideias. Estamos a um passo de legalizar o duelo para solucionar alguma rusga.
Algumas semanas atrás Mantega foi agredido verbalmente em um restaurante. Posteriormente Suplicy em uma livraria também sofreu agressões. E agora foi a vez de Chico Buarque responder por sua opinião ou por um vídeo em que expõe o que pensa.
Leblon – o metro quadrado mais caro do Brasil – foi o palco do barraco. Lá as pessoas são elegantes, chiques e discretas. Vivem de rendas e passam férias em estações de esqui. Alguns têm apartamentos em Paris, Londres e New York. São pessoas educadíssimas com formação no exterior. É assim que nós, aqui da periferia, imaginamos o Leblon.
Mas quando o assunto é política o pau bate em Chico.
[Não pretendo argumentar sobre o posicionamento de Chico Buarque no que diz respeito à conjuntura brasileira. É um direito que temos de ser contra ou a favor mesmo que não agrade a viseira ideológica de algumas pessoas.] O fato de eu achar que o Bolsonaro merecesse uma tunda de laço não quer dizer que quando encontrar o deputado – toc, toc, toc – eu vou sair de relho pra cima dele. O que a neodireita ainda não percebeu é que, independente do que ela deseja, a democracia sobreviverá.
Essa gurizada do Leblon poderia bater em Chico, mas bater também em Castelo... Médici... Geisel... Figueiredo. Só para citar alguns “Franciscos” que mereceriam umas porradas. Mas é o tal negócio: vamos bater em Chico. E extravasar nossa raiva primitiva e sair cantando pneus em uma Ferrari.
Quem sabe nos próximos debates políticos os candidatos compareçam com tacapes. E antes façam aquela encarada no melhor estilo MMA. Mas eu ainda acho que no final vai dar tudo certo. A vitória será da democracia. E nós continuaremos a admirar os artistas e os políticos decentes independentes do que pensam ou deixem de pensar.
Agora me deem licença que vou abrir meu Romanée-Conti que ninguém é de ferro. E passar a virada em meu apartamento em Cacimbinhas.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

A mulher do Avon



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Eu não sabia quem era o Seu Avon, mas a mulher dele, seguidamente, aparecia lá em casa para uma longa prosa com minha mãe.
Eram amigas, acho que eram amigas desde a infância, minha mãe oferecia chá com bolachas Maria ou um mate doce. Teve uma tarde que elas detonaram uma jarra de Q-suco de morango com bolachas de água e sal. Naqueles tempos não havia o temor da balança e do diabetes. A mulher do Avon era muito querida, trazia revistas que minha mãe folheava, atentamente, e em outras vezes trazia presentes.
Nos dias de visita – muita das vezes na hora do almoço – a mãe comentava que tinha que preparar algo para esperar a mulher do Avon. O pai não gostava dela, achava uma mala sem alça, decerto tinha lá os motivos dele.
Nos meus dez anos o que importava eram os jogos de futebol no campinho próximo da minha casa, andar na Monareta e assistir Bonanza nos finais de tarde. As amigas da mãe eram, apenas, amigas da mãe.
Mas me intrigava o oculto do Seu Avon. Deveria ser uma pessoa importante, tão importante que a mulher dele não tinha nome, era simplesmente a mulher do Avon.
Certo dia a mãe falou que a mulher do Avon estava doente e foi visitá-la no hospital. No dia seguinte a mulher do Avon falecera. Foi um dia muito triste lá em casa, aliás, em toda a vizinhança.
Quando meus pais voltaram do velório perguntei como estava o Seu Avon – aquela pessoa importante que nunca tinha visto –, afinal, eram amigos da nossa família e eu tinha que mostrar um interesse no acontecido.
– Que seu Avon, guri? – minha mãe devolveu a pergunta.
– A mulher dele não morreu? Ele está bem?
Com um semblante ainda triste, minha mãe sorriu e não disse nada.
E eu nunca fiquei sabendo quem era aquele tal de Avon.

domingo, 22 de novembro de 2015

Macaquinhos... o furo é mais embaixo



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Eu titubeei em comentar sobre Macaquinhos. A performance sobre a exploração anal.
A minha capacidade de avaliar uma obra de arte não vai muito além do “bonitinho”, “legal”, “gostei” e “não gostei”. Sobre Macaquinhos posso dizer que não assistiria ao espetáculo. Estou muito aquém de ser plateia e a tal representação está muito além das minhas possibilidades de divagação. Um bando de adultos enfiando o dedo um no cu do outro não está no horizonte utópico de uma atividade cultural.
Segundo os atores de Macaquinhos a ideia é mostrar o desequilíbrio social entre as nações do hemisfério sul, representado pelo ânus, e os emergentes (sic). Diria que é uma análise com muita profundidade. Mas também poderia ser uma relação entre povo e governo nessas mesmas nações do hemisfério sul. E adivinha quem entraria com o dedo?
Eu daria um dedo da mão para ver na plateia o Bolsonaro, Eduardo Cunha e o Feliciano. Aí seria diversão na certa.
Enfim, acho que a questão não deve ser centrada no ânus e, sim, no dedo.  Nessa performance vemos a utilidade do dedo. E isso o Gaúcho da Fronteira já cantou no século passado. Quer dizer, na exploração do dedo, Macaquinhos está atrasado em relação ao cantor gaudério.

sábado, 7 de novembro de 2015

Vamos falar sobre fair play



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

No jogo de hoje no Beira-Rio o pessoal da Ponte Preta se encheu de razão e reclamou a falta de fair play por parte dos jogadores do Inter. E essa falta de jogo limpo resultou no gol da vitória. E as reclamações se estenderam para fora das quatro linhas. Um alvoroço. Vi várias vezes o lance. Aparentemente há motivos para a polêmica. Mas existe fair play e fair play. Aliás, se formos analisar a fundo uma partida o jogo limpo é o que mais faz falta. [Não sei se fui feliz no trocadilho].
No Brasil até no jogo limpo a gente dá um jeitinho. A nossa malandragem está enraizada em todos os segmentos. Os bacanas estão em assembleia permanente. No futebol, então, nem se fala. Vamos combinar que dentro das quatro linhas não existe anjos. Muito menos nos vestiários.
Faltando poucos minutos para o término do jogo o atleta se atira no chão e provoca um fair play. A bola é jogada para fora pelo próprio companheiro para atender o jogador caído.
Essa falta de fair play para provocar um fair play para atrasar o jogo ninguém contesta? Afinal, a regra é clara. E o jeitinho foi dado. E toda a Ponte Preta e Travessas, Pinguelas e Viadutos Pretos ficam sensibilizados com os reclames da Ponte. sqn.
Minutos antes desse lance, tão contestado pelos ponte-pretanos, um atleta da Ponte cai fora do gramado e rola para dentro do campo para provocar uma parada no jogo. Acho que está na regra. Ninguém sequer teceu um comentário.
Um jogo em que ninguém merecia a vitória o destino conspirou a favor do Inter e puniu um (fair play)-1 com um gol. Então, ainda vamos falar sobre fair play?
Quantas vezes vemos um atleta se atirar no campo momentos antes de ser substituído. Isso é jogo limpo? E isso não vale só para o jogo de hoje, vale para todas as séries desse inoxidável brasileirão.
No jogo de hoje o Inter venceu e ainda está no páreo com um gol [in]contestável. É por isso que o futebol é apaixonante. A lógica é subvertida seguidamente, salvo se tiver em campo um certo time de São Paulo. Bueno, aí é outra história. Porque nesse caso o quadrado da hipotenusa nem sempre é igual a soma dos quadrados dos catetos.

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

O meu tocaio de nascimento



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

O país Argentina merece umas reflexões que os brasileiros – por conta de uma rixa fabricada – teimam em não fazer. E são muitas.
Admiro aquele estilo “sangue nos olhos”, acho que minhas origens castelhanas trazem um pouco desse sangue. Mas o fato é que a Argentina produziu algumas figuras que foram expoentes máximos nos seus respectivos campos de atuação. Gostaria de citar apenas quatro argentinos que são extremamente populares na América Latina e, porque não dizer, no mundo. Diego Armando Maradona, Jorge Luis Borges, Ernesto Guevara e Jorge Mario Bergoglio Sívori. Pessoas reconhecidas por seu talento e trajetórias contundentes.
Cada um desses castelhanos foram, e são, sumidades nas suas áreas de atuação. Guardadas as contradições, todos admiráveis.
Mas Dieguito foi o cara que jogou uma bola, pra lá de redonda, quando eu era um torcedor do futebol arte. E era fã do Tele Santana. O talento para o futebol é para poucos. E Maradona jogava como poucos.
Muitos anos após descobri que Maradona nasceu no mesmo dia, mês e ano que eu: 30.10.1960. Costumo brincar que Maradona é meu tocaio de nascimento. Nesse caso, tamo junto. 5.5 nesse 30 de outubro.
Já admirava antes, mas consolidei minha opinião – talvez por essa coincidência – de que Dieguito é o maior atleta de futebol de todos os tempos. Sei que não é difícil para os cronistas esportivos brasileiros lerem uma quebra de paradigma, porque, nesse caso, os brasileiros tem uma cláusula pétrea para o melhor do mundo. Intocável, indiscutível. Mas as cláusulas pétreas foram feitas para serem revistas. E, também, depende dos parâmetros de julgamento. Nos meus critérios de avaliação para eleger o melhor atleta de todos os tempos eu considero o talento com a bola, inteligência e consciência política [rs].
Então, nos meus critérios Diego Armando Maradona é o melhor de todos os tempos. E nesse dia eu abrirei um Malbec argentino para comemorar. Que venham mais 55.

Ah! Nesse dia trinta também fazem aniversário a cidade de Dom Pedrito e Fiodor Dostoievski.