terça-feira, 29 de setembro de 2009

A dura vida em Honduras


Antes de a crise estourar em Honduras, alguém sabia que Tegucigalpa era a capital? Particularmente, confesso que não. Nessa aula de geografia eu deveria estar para lá de Bagdá.
Buscando informações acerca desse imbróglio na América Central, percebi que a palavra Tegucigalpa é pomposa. É alguma coisa superior. Imagina alguém dizer “Eu sou nascido em Tegucigalpa. Eu fiz pós em Tegucigalpa”. As portas se abrem como por encanto. Essa sequencia de sílabas é alguma coisa próxima a um alinhamento de planetas. Eu achei muito chique uma transmissão de Tegucigalpa. Até acho que as olimpíadas de 2016... bom, deixa assim.
O fato é que em Honduras a vida anda dura. Um presidente latifundiário oriundo da oligarquia agrária resolveu consultar o povo para mudar a constituição. Manuel Zelaya queria alterar a constituição no intuito de permitir a reeleição. Como o mandato de quatro anos sem reeleição é uma cláusula pétrea, a Suprema Corte não gostou. Uma turma de ex-companheiros também não e os militares muito menos. Assim, numa madrugada o Mel Zelaya é despachado num voo para Costa Rica. Tanto a comunidade internacional como a comunidade gremista não gostaram. E todos acharam que a democracia deveria ser restabelecida em Honduras com a volta do presidente deposto. Roberto Micheletti, o presidente que assumiu, não gostou de ser chamado de golpista. O mundo todo debateu se foi golpe ou não. O Zelaya entrou clandestinamente no país e se refugiou na embaixada brasileira em Tegucigalpa. Mas a nítida impressão foi de que Zelaya ocupou a embaixada brasileira e a transformou em palanque político para retornar ao poder pelos braços do povo. Novamente, o Micheletti não gostou e, de um golpe só, fechou emissoras de rádio e televisão e introduziu o estado de sítio. Relançando antigos filmes de Costa-Gavras.
Lula disse que não reconhece governo de golpista. O governo brasileiro está correto em não reconhecer governos de ditadorezinhos que calam a imprensa, restringem direitos civis e rasgam a constituição, principalmente se for um paisinho chamado Honduras.
Para mim, modesto palpiteiro, a resolução seria simples. O Zelaya volta para as suas fazendas como um presidente aposentado. Funda a Fundação Mel Zelaya de combate a fome para deduzir alguns trocados no imposto de renda. Micheletti antecipa a posse do presidente eleito em novembro e todos vivem felizes para sempre... simples. Mas as coisas não são tão simples e essa crise em Honduras pode ser maior que a greve dos bancários.
Pode ser insensibilidade minha com os hondurenhos, mas eu estou preocupado em saber o nome gentílico de quem nasce em Tegucigalpa. Pois Tegucigalpa é um nome altissonante e a gente enche a boca ao pronunciar. Eu fiquei dois dias com essa palavra martelando na mente: Tegucigalpa, Tegucigalpa, Tegucigalpa, Tegucigalpa. Afinal de contas, quem nasce em Tegucigalpa é...

domingo, 27 de setembro de 2009

"Caçapava não se entrega"


Quando recebi o convite para escrever uma crônica sobre a cidade de Caçapava do Sul, pressenti um grande desafio. Caçapava tem muita história para ser contada e não seria eu a melhor pessoa para esse fim. Minha ligação com a cidade se reduz a um projeto Rondon na Vila Sul no início da década de 80 e, recentemente, uma visita a feira do livro.
Naquele projeto Rondon, num mês de julho perdido no passado, eu senti na pele o vento Minuano soprando gelado da pampa. Foram duas semanas de muito frio do inverno e muito calor humano de Caçapavanos.
Uma feira do livro nos faz pensar. Uma cidade que organiza uma feira do livro é uma cidade que fomenta a cultura, a arte, e é instigada pela inquietação.
Pensando sobre o Projeto Rondon e Feira do livro, resolvi dar uma cor a essa crônica. E optei pelo vermelho. O vermelho nos remete a outras reflexões que também tem tudo a ver com segunda capital farroupilha.
Tenho um passado maragato, pois meu avô ostentava um garboso lenço vermelho. E meu pai era um fanático torcedor do Internacional de Porto Alegre. Com essa ascendência, era lógico que me transformaria em um fervoroso colorado e, consequentemente, simpático às causas maragatas. Assim a cor vermelha está presente em minha vida desde tenra infância.
A cor vermelha simboliza a paixão, é “caliente” e traz no seu bojo a rebeldia, a revolução. Uma inquietude com o que está posto. E quando falamos em revolução invocamos a Revolução Farroupilha. Caçapava foi domicilio e berço de heróis e está gravada nos anais das nossas glórias. É evidente que, nos dias de hoje, Caçapava tem chimangos, maragatos, gremistas e colorados. A convivência é harmoniosa e a rivalidade fraterna. Mas como colorado que sou também gostaria de falar de outro ilustre filho de Caçapava e que também nos remete ao vermelho. Assim, resolvi incluir nessa crônica um humilde caçapavano. Não era revolucionário e não era farroupilha, mas foi ídolo em minha adolescência. Chamava-se Luis Carlos Melo Lopes. Craque da bola e um dos responsáveis pelas conquistas do Internacional. O nosso grande centro-médio Caçapava, a muralha que barrava os ataques adversários.
Para homenagearmos a cidade de Caçapava do Sul, é justo que relembremos o craque nascido nessa terra e que deu tantas alegrias ao futebol gaúcho.
Nos dias atuais somos tomados pelo pessimismo em virtude do grau de desmandos que assolam o país, sentimos falta de heróis e de guerreiros para serem novas referências. Precisamos de novos farroupilhas para ressaltarmos a ética e novos Caçapavas para barrarmos a indecência. O brado “Caçapava não se entrega” se equivale a “Esta terra tem dono”. Assim, mostrarmos ao mundo que nosso coração bate com paixão e oferecemos um abraço fraterno porque aqui, também, a fraternidade é vermelha.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Que loucura Jorge!!


O encontro foi casual.
Num dia de chuva Mário oferece abrigo em seu guarda-chuva para a linda Iracema atravessar a rua.
Debaixo da marquise Iracema estava sorridente e simpática. Mas tudo ficou no “muito obrigado” e no “agradeço sua gentileza”.
Mario ficou abobado pelos lábios carnudos de Iracema e o seu alvo sorriso.
Mario passou a tarde pensando em Iracema numa desilusão de dar dó. Conformado, pois dificilmente a encontraria outra vez. Mas a ironia do destino ainda estava para pregar mais uma peça. Dois dias após, Mario estava numa fila para assistir ao show de uma banda gaúcha no Gigantinho. Caminha lentamente para entrar no ginásio quando de repente vira-se. Quem estava ali ao seu lado? Ela mesma, a deslumbrante Iracema.
– Você não á a moça da chuva, ou melhor, a moça que se abrigou em meu guarda-chuva?
– Isso mesmo! Estou lembrando, você... veja como é o destino. Muita gentileza sua.
Ficaram juntos e se divertiram assistindo ao espetáculo dos roqueiros. Pularam e cantaram durante duas horas. Ao final, Mario convida Iracema para irem a um bar. Na mesa do bar a conversa fluía solta. Iracema ria das frases de efeito de Mario. Mario ria do sorriso de Iracema.
Naquela mesma noite foram para o apartamento de Iracema. Ao som de Martinho da Vila.
//É devagar. É devagar. É devagar. É devagar. Devagarinho//.
À meia-luz, começaram a dançar no meio da sala. O primeiro beijo foi o sinal. Mario colocou a mão por dentro da calça jeans de Iracema e acariciou seu ventre. Em instantes estavam rolando abraçados pelo chão aos beijos e gemidos. Quando ambos estavam despidos, Iracema pára e faz uma indagação.
– Marinho! Posso te chamar de Jorge?
– Jorge? Meu nome é Mario.
– Sabe o que é Marinho, eu fico muito excitada falando o nome de Jorge quando estou transando. Não é nada com você é que Jorge me deixa louca. Eu falo Jorge o tempo todo e fico doida. Fico doida e faço tudo o que tu quiseres, Marinho.
– Então tudo bem.
Mario estava imaginando mil coisas com os lábios de mel de Iracema. Completamente nus no meio da sala, Iracema começou a acariciar Mario com seus lábios carnudos. Mario urrava de prazer.
– Ssilêêêênciiiooooooo vocês aí em cima – foi o berro que veio da rua.
Mario e Iracema estavam em outra dimensão e não ouviam nada além de seus gemidos de dor e excitação.
– “Ceminha” vira de costas? – Ceminha era como Mario começou a chamar Iracema.
– Viro Jorge. Vem Jorge. Que loucura Jorge!
– Hhhuuggghuuuhhuuu! Mario estava exausto e acabado.
Iracema gritava, gritava para todo prédio ouvir.
– Que loucura Jorge. Que loucura Jorge. Que loucura Jorge. Que loucura Jorge. Que louuuuccccuuuuuuuuuura Jorge.
De repente todo prédio começou a gritar e foi uma gritaria infernal e uníssona. Em ritmo de samba. /Que loucura Jorge. Que loucura Jorge. Que louuuuccccuuuuuuuuura Jorge.//
Sentado no sofá Jorge, ou melhor, Mario saboreava um cigarro. Cantarolava um samba de Adoniram Barbosa. // Iracema! Eu bem lhe dizia, cuidado atravessar a ruuua, eu falava, mas você não me escutava não. Iracema você atravessou contramão.//