segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Fio de bigode


Em outros tempos, por essas bandas, existiu o fio de bigode. Uma atitude de pessoas sensatas e honradas. Uma expressão para selar um acordo. O fio do bigode era a garantia da palavra empenhada que valia bem mais que uma certidão. E não faltam por essas paragens, nobres cidadãos com uma vasta barba para ofertar um fio num empenho verbal diante de uma tribuna, de uma plateia.
No entanto, a palavra é dita e desdita no dia seguinte. Hoje, não vale mais o que foi vociferado, acordado ou escrito. Esqueçam tudo que escrevi. Nós já ouvimos essa frase e ficamos boquiabertos. As palavras são fúteis e desacreditadas e tudo se encerra num grande conselho de sobrenome Ética. O mais recente fato foi o anúncio, em caráter irrevogável, do senador Aloizio Mercadante de sua renúncia à liderança do PT no Senado. O irrevogável tornou-se “irrerrevogável”.
O arquivamento das denúncias contra Sarney não coloca fim nessa crise do Senado. A Câmara Alta está estagnada. O marasmo, as lamúrias e as desculpas são as marcas dessa trágica legislatura. Todos os nobres que se explicam viram coitadinhos. Todos têm uma versão convincente. Como se nós, espectadores, fôssemos um bando de néscios. Somos?
A crise continuará porque os personagens desse dramalhão são os mesmos. Mas temos muito a lamentar. Quando olhamos para o passado do PT, e os motivos pelos quais estudantes, trabalhadores e intelectuais desfraldaram uma bandeira vermelha com uma estrela amarela, não conseguimos ver o que pode ser diferente doravante. Não há mais paixão. O coração não palpita como outrora. O PT mudou e muitos militantes não acompanharam essa mudança. Continuaram sonhadores.
Quando o bigode do Mercadante torna-se igual ao bigode de Sarney, o fio de bigode como símbolo da palavra empenhada, vira passado longínquo. Vira peça de ficção.
O que sobra para a política é a novidade, o inesperado. Algo que modifique essa previsão matemática, essa fórmula carcomida. Esse produto cartesiano. A dualidade é uma rigidez que limita e empobrece o debate. Se faz necessária a poesia de uma dialética confusão. Não precisamos do pronto e acabado, do taxativo. É oportuno que experimentemos o esculhambado e por fazer.
Existe alguma ação mais singela do que pisar na grama molhada e comer um pêssego num fundo de campo e – citando Mario Benedetti no poema A ponte –, perceber que em algum lugar alguém nos espera com um país. Nos dias de hoje, pouco provável. Nós queremos uma paixão avassaladora que nos devolva às ruas, às praças e aos comícios em 2010. Seja qual for a cor da nossa bandeira. Ou a quem desejar: um simples fio de bigode.

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