A chaleira
preta chia no fogão à lenha, anunciando que está pronta para o chimarrão. Cevo
o mate na cuia morena e sorvemos o amargo regato com os olhos atentos na
imensidão da pampa.
A sombra do
cinamomo, no calor do outono gaúcho, é o cenário preferido de nossas longas
mateadas. O “Velho” com seu inseparável lenço maragato e sua bombacha parda é o
parceiro nessas tardes de causos, reminiscências e silêncio campeiro. Enquanto
as chilenas descansam solitárias num canto do galpão e um vira-lata late
faceiro junto a porteira, chimarreamos e contemplamos o alaranjado da pampa que
consome o sol indo ao encontro da noite. Ao longe um estrépito de patas de
cavalo levantam poeiras na estrada. A antiga bomba de alpaca, herança de um avô
que pelejou com ferro branco nas revoluções, nos acompanha com seu renovado
brilho prateado. Amassada, não tem mais a ponteira de ouro, mas é a companheira
predileta nos vespertinos mates. Entre um pito e um mate, contou-me, o maragato
com os olhos voltados lá para o passado, que nesta bomba o Leão do Caverá
chimarreou com os caudilhos, num capão de mato, em uma pausa na revolução de
23.
E o guri
cresceu neste chão colorado, batendo espora em potrilhos, o lenço encarnado
solto ao vento e mateando na velha bomba. Sorvendo o verde amargo, tradição de
gaudério, na calmaria da terra pampeana.
Tantos foram
os mates na parceria do saudoso maragato que o último causo ficou inconcluso.
Num mês de maio fatal o “Velho” anoiteceu. Deixou de lado o buçal, as chilenas
e a guaiaca. Deixou a bomba de alpaca cravada na erva adormecida. Deixou a
chaleira preta esquecida sobre a chapa do fogão. Em silêncio foi embora, deu de
rédeas na aurora e galopou na direção do céu. Ficou o último adeus no vítreo
dos olhos. As profundezas dos nossos sonhos serão renovados em longas mateadas
e um jovem parceiro será o herdeiro da bomba de alpaca.
Herdei
a velha bomba e hoje dedilho uma milonga nos mates que sorvo “despacito”.
Continuo com o olhar no infinito nas tardes que ficaram um pouco mais tristes.
O mate ficou mais amargo, mais comprido. Nunca mais sorvi um chimarrão como
aquele sorvido no derradeiro domingo. E sigo ansioso por um mate antigo naquela
bomba de alpaca, que ainda hoje carrego comigo.
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