terça-feira, 28 de julho de 2009

Primavera con una esquina rota


O belo romance editado pela Alfaguara Primavera num espelho partido não surpreende, porque o talento de Mario Benedetti não causa surpresa. Ao terminarmos a leitura percebemos que somos um pouco mais humanos. Um pouco mais gente. Ao abrirmos um romance de Benedetti temos certeza de uma agradável companhia.
O protagonista da narrativa, Santiago, é um preso político da ditadura uruguaia. Comunica-se com a família por cartas, e nessas correspondências são tratadas as agruras do cárcere e as incertezas dos familiares no futuro.
A narrativa passeia pelas vozes dos personagens, inclusive, nos relatos vividos no exílio pelo próprio Benedetti. Mas o autor do excelente A trégua supera-se na criatividade e na ludicidade quando Beatriz, a filha de Santiago, assume e narra a história: tango é uma música triste que se canta quando se está alegre para ficar triste de novo. A passagem pelo aeroporto eu deixo para o leitor descobrir. Bem como a notícia a ser dada a Santiago quando de sua liberdade.
O texto de Mario Benedetti é tão envolvente que passa a sensação de que poderíamos, a qualquer momento, nos encontrarmos em uma esquina – talvez rota – em Montevidéu para tomar um café.
Um detalhe apenas ficou meio estranho, o título em espanhol Primavera con una esquina rota foi traduzido para o português como Primavera num espelho partido. Ficou meio “roto” embora mais poético. Mas o porquê da Primavera fica evidente no romance.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

O argentino não era o culpado

A mídia esportiva foi praticamente unânime em afirmar que o elenco do Internacional para o ano de 2009 era um dos mais qualificados do Brasil. Apenas um inexpressivo comentarista arriscou que o Inter seria o cavalo paraguaio da competição – a exemplo dos “atentados” contra Bush, eu quase atirei um sapato na televisão – mas mantive a calma diante da estultice do jornalista e do prejuízo com o conserto.
O fato é que o Internacional decidiu o campeonato Gaúcho, pelo segundo ano consecutivo, com uma estrondosa vitória de 8 a 1 sobre os adversários de Caxias do Sul. E lamentamos que o oponente não tenha sido o co-irmão da Azenha. Posteriormente, o colorado dos pampas decidiu a Copa do Brasil e a Recopa Sul-Americana.
Aqui começa a estória do argentino pé-frio.
A turma se reunia para assistir aos jogos do colorado. Essas reuniões, regadas a cerveja e tequila, começaram em 2006 com a vitória contra o Barcelona – que é sempre bom lembrar para levantar o moral – e naquele primeiro jogo da decisão da Copa do Brasil, contra o Corinthians em São Paulo, apareceu um argentino, assim, meio do nada. O castelhano era oriundo de Rosario e intercambista do curso de veterinária. Dois fanáticos e desconfiados colorados entreolharam-se sestrosos, mas logo acataram o novo torcedor, pois o gaucho era San Lorenzo desde criancinha, time que revelou o D´Alessandro. Sendo assim, ficou enturmado.
Ao final da primeira partida no Pacaembu, diante dos gols do Corinthians, alguém comentou que o castelhano era pé-frio, mas os demais não deram a menor bola, o cara era da terra de D´Ale e Guiña. Era dos nossos. Trazia no âmago a garra farrapa. E dá-lhe pero que si, pero que no.
No primeiro jogo da decisão da Recopa, por via das dúvidas, uma das gurias trouxe um par de pantufas vermelhas para o argentino, mas a derrota foi inevitável e o colorado perdeu de um a zero.
– Esse rascunho do Che Guevara é pé-frio – comentou a guria que trouxe as pantufas.
Nos jogos da volta da Copa do Brasil e da Recopa, o argentino foi paramentado com um gorro de lã, um pala, uma bandeira sobre os ombros, um par de meias e, logicamente, as pantufas. Claro, era o mais próximo da lareira. Volta e meia alguém alcançava um copo de quentão para aquecer o hermano. Mas as tragédias das decisões estavam anunciadas. E eram inevitáveis. E sempre alguém comentava: esse castelhano é pé-frio.
Para o Gre-Nal comemorativo dos 100 anos do clássico, o castelhano, constrangido, não deu as caras. Telefonou avisando que sequer assistiria ao jogo. Iria passear pelo Calçadão e pelo Parque Itaimbé com uma cuia cevada para o amargo e uma viola. Iria dedilhar umas milongas para matar a saudade de sua amada Argentina com músicas de Os Chalchaleros e Atahualpa Yupanqui. A turma sentiu-se aliviada.
Como vimos, não sabemos quais foram os motivos de derrota do Inter no Gre-Nal dos 100 anos, se houve alguma influência extra-campo, mandinga de batuqueiro ou uma fogosa castelhana atrapalhando o desempenho dos nossos castelhanos. Mas, definitivamente, o argentino não era o culpado pelas derrotas do Inter.

domingo, 19 de julho de 2009

A casa de papel


A casa de papel é uma novela do argentino Carlos Maria Dominguez que vive em Montevidéu.
A narrativa é interessante porque o desfecho da biblioteca de um dos protagonistas é inusitado. Uma pessoa, Bluma Lennon, morre atropelada em uma esquina quando lia um poema. Pouco tempo após seu colega de universidade recebe um livro endereçado a Bluma com resquícios de cimento na capa.
Aí começa a busca de Joseph Conrad pelo remetente do livro e o porquê do cimento incrustado no exemplar de A linha da sombra.
Uma reflexão deve ser feita.
Como pode um aficionado por livros, que tomava banho gelado para não danificar com vapor a parte da biblioteca que estava no banheiro, transformá-los em uma casa de papel?
E outra pergunta deverá ser respondida pelo leitor. Qual o destino dos nossos livros? Da nossa biblioteca?
A leitura é fácil a prazerosa, as respostas nem tanto.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

No meu Cross Fox


Com mais de um milhão de acessos, Stefhany, uma adolescente de 17 anos do interior do Piauí, é sucesso no YouTube. Incentivada pela mãe, a garota de Inhuma produziu um vídeo com sua música mais popular. Tornou-se absoluta cantando “Eu sou Stefhnay” enquanto dirigia um Cross Fox emprestado pelas ruas de terra batida da cidade. “No meu Cross Fox/ eu vou sair/ vou dançar/ e me divertir”.
Essa guria adquiriu enorme sucesso no norte e nordeste brasileiros. A agenda de shows chega a marca de vinte e cinco mensais. Stefhany foi aclamada no Caldeirão do Huck. Dona Nety, a mãe, chegou no Caldeirão montada em um jegue e ambas saíram com um Cross Fox amarelo ofertado pela Volkswagen. O próximo passo será a aquisição de um ônibus para transportar seu staff nas turnês pelo Brasil afora... ou adentro.
Quantos dos nossos atuais, bem-sucedidos e badalados artistas iniciaram a carreira cantando um Cross Fox à moda antiga?
Um Fuscão preto feito de aço rodou pelas ruas desse país, mas o sucesso não acarretou em perenidade midiática para os autores. Hoje poucos se lembram do artista que interpretava a música e muito menos quem era a tão falada dama da noite que fumava e bebia sem parar.
Uma Brasília amarela que estava sempre de portas abertas, também encantou os jovens e crianças desse país, mas o sucesso do irreverente grupo de Guarulhos foi prematuramente interrompido por um trágico acidente de avião.
Uma jovem e angelical cantora veio de táxi porque estava com saudades e hoje faz enorme sucesso como cantora e apresentadora de programas globais. Chegou de táxi e está montada na grana.
Recentemente um sexagenário senhor completou 50 anos de incontestável sucesso e começou a carreira cantando um Calhambeque bi bi, embora as emoções sejam o seu maior legado. Precisa dizer algo mais? Não faço ideia que carro ele dirige hoje.
Julgando-se pela qualidade e padrão do carro que está iniciando a jovem Stefhany, podemos afirmar que, num curto prazo, a meteórica musa do YouTube terá uma veiculação internacional e sentirá saudades de seu modesto Cross Fox dirigindo uma Ferrari pelas avenidas da Cidade Maravilhosa.

sábado, 11 de julho de 2009

Obama não olhou...


Uma foto correu mundo no encontro de poderosos, pseudo-poderosos e candidatos a poderosos em L’Aquila, na Itália. Tudo por causa de uma suposta olhadela de Obama para o traseiro da representante brasileira que participava de um “gezinho”, o chamado Júnior 8.
A carioca Mayara cruza exuberante em frente os presidentes dos Estados Unidos e da França. Ambos olham para o rebolado da guria, posteriormente um vídeo “inocenta” o Barack, mas salienta a fisionomia de sarcasmo do marido de Carla Bruni. Convenhamos, a foto é reveladora dos dotes da beldade brasileira e dos olhos de águia dos dois presidentes.
Eu imagino o Sarkozy tirando o maior sarro cantando “Ela é cariocá, ela é cariocá...” e recebendo um beliscão da Carla. O Obama atracaria o “Tico-tico no fubá”. Um Tico-Tico só/ O Tico-Tico lá/ Está comendo/ Todo, todo, meu fubá/ Olha seu Nicolau... olhando para o Sarkozy. Claro que o presidente cantaria “Taico-taico”.
No Brasil a bunda está consagrada como preferência nacional. Ponto para nós, e eu como sul brasileiro estou incluído no topo dessa estatística. Esse dado é fato, basta observarmos as propagandas de cerveja, cigarros e seja lá o que for. Sempre tem um atraente e deslumbrante traseiro para chamar a atenção. E aí tem nome para tudo. Garota melão, melancia, moranguinho e uma salada de frutas completa. Tudo se resume em um minúsculo fio dental e umas superabundantes nádegas.
Nesses encontros de cúpula – cúpula bem entendido – sempre tem uma bunda para ser apreciada. Será que num jantar regado a “Château Lafite” o Obama não dá uma discreta olhadinha para o traseiro de Carla? E o Sarkozy seria mais discreto ao contemplar os atributos de Michele? Com relação ao Berlusconi não temos dúvidas...
Tenho algumas incertezas, dado o nosso padrão de beleza contemporâneo, se a Ângela Merkel, primeira-ministra da Alemanha, seria contemplada com um desses olhares matreiros.
Não vejo maldade nesses olhares, o que é belo deve ser admirado – e sem machismo nisso – todos gostamos de ser observados, por mais barrigudos, carecas e baixinho que sejamos. Imaginem um belo traseiro cruzando em nossa frente. É óbvio que temos que olhar.
Se o Obama não olhou... deveria ter olhado. Discretamente, claro.