Um dos livros mais vendidos e comentados nos
últimos tempos no Brasil é “A privataria tucana”.
O livro traça um histórico de como foram
feitas as negociações para as privatizações que ocorreram – a lo largo – no governo de Fernando
Henrique. À medida que o folheamos nossa indignação aumenta exponencialmente. Na
metade da leitura esgota-se todo o estoque de indignação. Conclui-se que foi
feita uma deslavada entrega de patrimônio público à iniciativa privada.
Se essa
escandalosa privataria nos deixa transtornados, deveríamos dar vivas com relação
a uma estatização. Ou não? Acho possível abrir essa pauta de debate.
Qual empresa
você estatizaria no Brasil? Siderúrgica? Setor de energia? Comunicação? Telefonia?
Escolha sua veia estatizante. Não se fala mais nisso desde a campanha do Sul
Brasileiro. Alguém lembra do Sul Brasileiro? Não está mais no horizonte da
esquerda – ou da autoproclamada esquerda – essa abordagem. E o silêncio é
alarmante.
Um parêntese.
Tenho
lido alguns comentários nas redes sociais sindicais. Quando alguém quer criticar
outro alguém de outra esquerda o qualifica de esquerdismo. Então, a gente
combina assim: se uma determinada esquerda critica outra determinada esquerda –
ou autoproclamada esquerda – por esta estar no governo, a crítica vem como
esquerdismo agregado na maioria das vezes por inconsequente e aliado da direita.
Uma maneira de a esquerda desqualificar outra esquerda. Aliás, cadê a esquerda?
Mas isso era só um parêntese.
Recentemente
a presidente Cristina Kirchner estatizou a maior empresa da Argentina, a
Repsol. E foi um deus-nos-acuda do capitalismo global. A elite internacional
entrou em campo prometendo retaliações. Tacharam de golpe. Retrocesso etc, etc,
etc. A União Europeia propõem retaliações à Argentina. E expulsão do G20. Mas quem
é essa União Europeia – toda esgualepada por conta da crise gerada por eles
mesmos – para propor retaliações? A resposta é simples. O BRIC não empresta a grana que eles estão pedindo.
Pronto! E empata o jogo.
Do ponto
de vista da radicalidade a estatização da petrolífera Repsol-YPF foi maior que
a de Chávez e Evo. E não foi uma estatização, foi uma reestatização. Carlos Menem
havia privatizado a empresa em 1999. Então, do ponto de vista ideológico, o
povo da Argentina passa a ser dono da Repsol, assim como o povo do Brasil é
dono da Petrobras. Vejo com simpatia essa “afronta”, pois a impressão que passa
é de um capitalismo tão arraigado que é impossível falarmos em algo diferente. Olhos
de águia faíscam para quem avançar um milímetro em algo diferente da iniciativa
privada, do neoliberalismo, do que está posto. Corajosa essa atitude da presidente
castelhana com uma postura radical diante do sistema e da globalização. É grande
a dominação, que nos acostumamos com a nossa inércia. Uma apatia enorme que
impede de irmos às ruas bater panelas. E quando Cristina anuncia essa expropriação
ficamos estupefatos. Boquiabertos e titubeamos.
Está em
jogo nessa atitude da presidente Cristina Kirchner uma questão estratégia. Pois
neste ano foram descobertas gigantescas reservas de petróleo na região de Vaca
Muerta. E a presidente se espelha na Petrobras que, ainda, detém o controle da exploração
das nossas reservas.
O capitalismo
internacional quer transformar o episódio numa questão jurídica, legal, direito
internacional e o escambau a quatro. Mas para mim, é uma questão ideológica. Afinal,
pulsa um coração no sul da América do Sul. Gostei dona Cristina, siga em
frente.
E a
esquerda no Brasil? Silêncio. Nem esquerda e nem esquerdismo se manifestou. Se somos
contra a privataria não deveríamos ser a favor da estatização da Repsol? Um bom
começo é fazermos uma autocrítica dos últimos anos. Mas isso é impossível
enquanto não transformarmos numa única palavra as várias existentes: esquerda,
esquerdismo, esquerdalha, esquerdoico e esqualquercoisa. Mas é mais cômodo
ficar em voltas com o próprio rabo do que debater temas polêmicos. É mais
cômodo deixar as coisas como estão. Mas aqui do lado, a Cristina começou. Afinal
de contas, nem tudo que é sólido desmancha no ar.
3 comentários:
Athos,
Tu perguntastes aonde está a esquerda? Vejamos, se o PT atualmente é o governo, talvez a esquerda sejam aqueles sindicalistas que eu vi ontem em reunião com os caras do PSDB em São Paulo, no programa do CQC. Acho que realmente é sinal do fim dos tempos...
Athos,
Tu perguntastes aonde está a esquerda? Vejamos, se o PT atualmente é o governo, talvez a esquerda sejam aqueles sindicalistas que eu vi ontem em reunião com os caras do PSDB em São Paulo, no programa do CQC. Acho que realmente é sinal do fim dos tempos...
Infelizmente a esquerda está na engrenagem da burocracia nos governos, nos sindicatos ou discutindo as "profundas" desavenças das tendências do movimento. Aliás, a pauta do movimento sindical hoje são as eleições. Fazem uma eleição pensando na próxima.
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