quarta-feira, 30 de março de 2016

O lotação da linha Pindorama



Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Era vez...
Um lotação da linha circular Pindorama em um grande centro urbano foi motivo de acaloradas discussões por conta do condutor. Logo nos primeiros dias, após a inauguração, houve uma breve e insignificante polêmica, pois o motorista resolveu que deveria ser chamado de “motoristo”. Falou que tinha sido convidado para ser o condutor do lotação, e desejava ser chamado de “motoristo” Juvenal.
Alguns passageiros mostram-se insatisfeitos por tamanha exigência de um simples motorista. Eliseu, o primeiro passageiro a embarcar estava indignado, mas resignou-se ao sentar nos bancos da frente e na janela. Um professor de português afirmou que a palavra era de dois gêneros, mas o “motoristo” estava irredutível.
Após algumas semanas ninguém mais comentava sobre tal divergência. E o Juvenal continuava na condução do lotação da linha circular Pindorama. Aparentemente tudo estava normal, mas algumas manobras de Juvenal ao volante não foi do agrado dos passageiros. Dirigia o ônibus como quem pedalava uma bicicleta. Por vezes falava algumas frases que os passageiros não entendiam. A comunicação com Juvenal estava muito difícil. O descontentamento foi ganhando vulto e começaram as reclamações pedindo mais atenção do Juvenal.
A insatisfação foi tomando corpo e chegou à direção. Os passageiros mais exaltados estavam ameaçando alguns diretores na frente da empresa. Batiam panelas quando o lotação “passava lotado” pelas paradas.
Os mais raivosos pediam a troca imediata do motorista. Outros – amigos de Juvenal – gritavam “Não vai ter troca”.
Cada viagem da linha circular tornou-se um inferno. Uma parte dos passageiros gritava “Não vai ter troca” e outra parte gritava “Fora Juvenal”.
Numa calada da noite a direção da empresa resolveu se reunir para discutir e, se for o caso, definir o rito da troca do motorista Juvenal. Mas também decidiram que Juvenal continuaria na linha Pindorama por mais algum tempo. Precisavam de mais prazo para decidir.
Então, ocorreu o que ninguém esperava, os passageiros desembarcaram do lotação. Uma debandada geral. Eliseu foi dos primeiros e mais exaltados a desembarcar, dizem as más línguas com o lotação ainda em movimento. Inclusive o cobrador deixou seu cargo vago. Deixaram o Juvenal “solito no más” na condução do lotação. Não adiantou os gritos dos amigos de “Não vai ter troca”. O substituto de Juvenal já havia feito entrevista no departamento de recursos humanos e estava se aprontando para ser o novo motorista. Pronto para substituir o Juvenal na condução do lotação. Eram amigos – inclusive em outros tempos trocavam cartas –, mas o sonho de Hermínio era ser o motorista da linha Pindorama. E o cavalo estava passando encilhado...
Quando foi anunciado que Hermínio seria o novo motorista ele foi recebido com vivas. Agora, sim, a linha circular Pindorama teria um verdadeiro condutor. Todos estavam satisfeitos com a troca e voltaram em alvoroço para o lotação. Todos aqueles que debandaram por conta da troca de Juvenal voltaram a utilizar o transporte coletivo. Eliseu foi o primeiro a embarcar no lotação sob a direção do novo motorista. Embarcaram de braços erguidos dando vivas ao Hermínio. Era tamanha a euforia e felicidade dos passageiros que eles não perceberam quando Hermínio entrou na contramão, derrapou na curva e quase capotou o ônibus. Aos trancos e barrancos Hermínio passou a dirigir pelas ruelas, ruas, avenidas, não desviava dos buracos e não respeitava os sinais.
Hermínio era da mesma escola de Juvenal. Mas os passageiros estavam extasiados com o novo condutor e a normalidade havia sido recomposta na linha Pindorama.
E, assim, os passageiros da linha circular Pindorama viveram felizes para sempre.

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