sábado, 19 de novembro de 2011

A pedra do doutor Getulio


Athos Ronaldo Miralha da Cunha
twitter.com/athosronaldo

O feriado de 15 de novembro, uma terça-feira meio doida, as minhas opções variavam entre o Facebook, Twitter e um livro. Optei pelo livro e fui para o balanço de uma rede.
Adquiri “A Pedra do doutor Getulio” na feira do livro de Porto Alegre. O motivo foi bem singelo: fui atraído pelo desenho de um cadáver no chão. Em capa de livros policiais – volta e meia – é utilizado como ilustração o desenho de como foi encontrado o corpo assassinado. E sempre uma das pernas está encolhida...
Um desenho desses junto a um monumento histórico às margens do rio Uruguai é mais instigante. Não tive dúvidas, comprei.
O mais interessante nessa narrativa é que o investigador Manuel Ramos é assassinado nas primeiras 18 linhas do livro. Mas a história está recém começando.
Manuel Ramos é o delegado sem a menor vocação para investigador. Uma espécie de anti-herói da história que tinha como sonho ser cantor de tango em Buenos Aires.
A trama se passa entre 1942 e 1951. Inauguração da ponte internacional em Uruguaiana e Paso de Los Libres. No dia primeiro de janeiro de 1942 um barqueiro encontra um cadáver junto ao monumento. A partir desse estranho assassinato entram na história personagens como Hitler, Getulio Vargas e Osvaldo Aranha, tendo como pano de fundo a Uruguaiana da década de 40.
Termina, como ficamos sabendo na primeira página do livro, com o assassinato do investigador Manuel Ramos em Buenos Aires em 1951.
Um único senão, a capa eu achei pouco criativa.
Li a primeira página e só larguei quando li a última. Certamente, o próximo livro de Mauro Maciel terá a minha leitura. Uma estreia com fôlego nessa narrativa.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Síndrome de Carol

Athos Ronaldo Miralha da Cunha
twitter/athosronaldo

A Feira do Livro de Porto Alegre é um evento cultural de visitação obrigatória.
Todos os gaúchos deveriam ter uma espécie de Bolsa-Leitura para desfrutar de um dia na companhia dos livros e escritores. Então, dediquei um sábado para vasculhar os estandes a procura de boas leituras e entretenimento.
Um sábado é pouco, mas para quem precisa enfrentar 600 Km de estrada já é mais do que suficiente.
Eu poderia comentar sobre as obras adquiridas, uma boa e pesada dúzia de livros. Ou abordar sobre o agradável bate-papo com um amigo escritor. Mas, das minhas aquisições, vou destacar somente uma que vale como dica de leitura, como presente de fim de ano ou para ficar admirando diante da estante. “Contos Gauchescos e Lendas do Sul” de João Simões Lopes Neto. Uma edição luxuosa do Instituto Estadual do Livro. E um preço popular: R$ 19,99.
Cheguei por volta das onze horas numa Porto Alegre escaldante. Usei o Trensurb da rodoviária ao mercado e, ali mesmo, almocei. Um restaurante de primeira. Talheres, pratos, toalhas e cardápio impecáveis. Não pedi um vinho, pois teria que deixar um dos olhos da cara. Tomei um suco de laranja. Saciado, fiquei imaginado outras hipóteses.
Se eu tivesse ido a uma lancheria de quinta, pedido um pastel de vento e uma fanta uva. Saborearia o lanche diante de uma mesa de fórmica vermelha com partes lascadas e cadeiras de ferro enferrujadas. A garçonete poderia ser uma oleosa e mal-educada jovem, com um pano de prato sobre o ombro e com desodorante vencido. Imaginei que eu poderia zanzar pela feira e não ter achado nada que prestasse naquelas porcarias de saldos.
Um tumulto pelos corredores, roubaram minha carteira, perdi meu celular e meu cartão de crédito foi clonado. Tomei um banho de suor, caí no conto do bilhete premiado e comprei um relógio do Paraguai. Então, conclui que se eu tivesse tomado uma taça de vinho eu teria sido mais criativo nas minhas divagações. Cair no conto do bilhete premiado num sábado! Nem na ficção.
Como sou vacinado contra a “Síndrome de Carol”, eu devo dizer que minha tarde de feira foi exitosa. Gostei das minhas aquisições, principalmente dos autores gaúchos. Adorei o tumulto da feira e achei bons exemplares nos saldos.
Havia anoitecido quando peguei novamente o Trensurb do mercado até a rodoviária. Um senhor, meio perdido, perguntou onde era a Estação São Pedro, pois iria visitar o irmão que estava hospitalizado e não conhecia muito bem a capital. Era de Santa Maria.
– O senhor é de Santa Maria? Estou voltando agora às nove e meia – falei.
A vida é cheia de surpresas e contradições. Uns vem a Porto Alegre para desfrutar a feira do livro e extrapolar o limite do cartão. Outros para visitar o irmão que sofreu um acidente de carro, contando os trocados.
– Coincidência... – falou com um olhar sonhador.
Desci na rodoviária e, certamente, não verei mais o conterrâneo.
Assim, encerrei meu dia de feira do livro de Porto Alegre com alguns livros na bagagem.
A propósito: declaro para os devidos fins que o texto acima tem a pretensão de ser literário.
Ah! De lambuja ganhei um autógrafo e um beijo da ministra.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

7.000.000.000º

Athos Ronaldo Miralha da Cunha
twitter.com/athosronaldo

No último dia 31 de outubro – que é consagrado às bruxas, mas que o Saci Pererê e o Drummond pegam uma carona – a população da Terra atingiu a marca dos 7.000.000.000 de habitantes.
Em pouco mais de uma década o mundo cresceu um bilhão de pessoas, pois em 27 de janeiro de 1998 completamos meros seis bilhõezinhos de seres. Então, podemos concluir que na Copa de 2022, no Qatar, seremos oito bilhões de torcedores.
Quem será o sétimo bilionésimo vivente do planeta? Segundo dados dos organismos internacionais que espalham gráficos e tabelas estatísticas, o guri nasceu na África. Não vou colocar em dúvida, alguém deve ter feitos profundos estudos para concluir que o sétimo bilionésimo terráqueo nasceu na madrugada do dia do ferroviário em algum lugar do continente africano.
No entanto, segundo os meus parcimoniosos estudos – demográficos e “teográficos”, bem entendido? –, o 6.999.999.999º habitante nasceu na hora da sesta em Restinga Seca ou na grande Formigueiro. Um dado importante é que esse taura tem 80% de chances de ser colorado e 20% de chances de ser do PT, mas são dados imprecisos, com margem de erro de quatro pontos percentuais para mais ou para menos.
Não tenho bases cientificas para saber onde nasceu o sétimo bilionésimo primeiro humano (esse número é mais fácil de escrever). Corre um boato que foi ali pras bandas do Boqueirão. Podemos afirmar com 99,99% de acerto que o guasca é Missioneiro, não, necessariamente, galo.
Está rodando um email na internet que calcula qual a sua colocação entre os habitantes desse mundão de Deus. Digitei minha data de nascimento e verifiquei que eu fui 3.057.099.650º e em toda a história da humanidade eu fui o 76.725.447.578º. Com esses números fiz uns desdobramentos para Mega-Sena, mas tudo foi em vão.
Somos sete bilhões de humanos e uma preocupação salta aos olhos ante aos olhares de uma legião de famintos, maltrapilhos, excluídos, amordaçados pela opressão, perseguidos políticos, ditadores e um sem fim de agruras proporcionadas pela má distribuição de renda. O fato é que sete bilhões de terráqueos lutam por uma vida melhor em um mundo mais solidário.
Se os donos do mundo que, volta e meia, se reúnem em torno de um G. Se o G4, G8, G20 ou qualquer G reunido, resolverem um pequeno percentual da miséria dos homens e mulheres que suplicam por um prato de comida, podemos crer que os bilhões das próximas décadas terão uma vida melhor.
Enfim, se os humanos irão viver num mundo mais igualitário é uma aposta. Uma aposta que só será perdida quando os oito, nove ou dez bilhões que virão não tiverem mais um horizonte utópico. Aí pouco importa se a cidade natal do décimo bilionésimo humano for Restinga Seca, Formigueiro ou Paris. Pois, o que seria da vida na Terra se nos tirassem a possibilidade de sonhar?

sábado, 22 de outubro de 2011

Raposa Felpuda e o Tubarão de Charuto

Athos Ronaldo Miralha da Cunha
twitter.com/athosronaldo

No twitter o Jose de Abreu colocou a seguinte frase “2 meses atrás raposa felpuda do PT conversou com o ítalo-argentino Civita, dono da Veja. Ouviu dele: não tem arrego, vou derrubar a Dilma!”.
Eu fico alarmado quando um tubarão de charuto da nossa imprensa conservadora afirma que quer derrubar um governo. É alarmante porque esse indivíduo se coloca acima dos poderes constituídos, acima do bem e do mal. Que poder esse pseudoargentino, ou pseudoitaliano, tem para afirmar convicto “vou derrubar a Dilma”? Que carta ele tem na manga? Ou melhor, quem ele pensa que é?
Ah! É um governo corrupto? Como dizia meu pai “mata a cobra e mostra o pau” ou a cobra morta.
Construímos a democracia permanentemente, bem como, também diuturnamente construímos os partidos. Mas parece que algumas pessoas – muitas delas influentes – ainda não se acostumaram com a ordem democrática. Se um graúdo afirma “não tem arrego, vou derrubar a Dilma” ele deveria ser interpelado judicialmente para explicar melhor esse intuito. Ele só pode derrubar a Dilma se candidatando a presidente e ganhar no voto. É assim que eu imagino. Mas acho que o cidadão em questão precisa de aulas de democracia, ou, num programa da televisão, calçar as sandálias da humildade.
Nesse vai e vem da imprensa e da política, sempre aparece um bicho para ilustrar o nosso imaginário. Em 89 o velho Brizola resolveu engolir um “Sapo barbudo” e transferiu os votos do PDT para o Lula naquele segundo turno. E na política os bichos sempre estiveram em evidencia: Delfim, tucano, ratazana, lula, falcão, pomba, peixe e um zoológico inteiro.
E agora em pleno fogo cruzado de informações surge uma raposa felpuda do PT para contatar com esse tubarão, com esse peixe grande da grande imprensa. E isso também nos deixa estupidificado.
A Dilma conquistou o cargo de presidente no voto – respeitando os trâmites legais – e não vai ser um deslumbrado com arroubos de ditador que vai depô-la. Afinal de contas o poder emana do polvo, opa, do povo.
Nesses tempos de jornalismo investigativo e reportagens especulativas a corda sempre rebenta no bicho mais fraco. E, no final do imbróglio, quando a porca troce o rabo ou a vaca vai para o brejo a contrapartida vem do pato. E nesse caso o pato somos nós, os peixes pequenos.

domingo, 2 de outubro de 2011

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Athos Ronaldo Miralha da Cunha
twitter/athosronaldo

Você pode não ter se dado conta, mas o número aí em cima é o famoso π. Tomamos conhecimento do π quando aprendemos a calcular a área de um circulo A = Pi.r2 que para um pré-adolescente não deixa de ser uma aventura. Quanta emoção ao sabermos o comprimento de uma circunferência. C= 2.Pi.r
O π passou a fazer parte de nossas vidas. Se formos calcular o volume de uma esfera usamos a fórmula V = 4/3.Pi.r3 e se quisermos calcular a área A = Pi.r2. Dada a sua irracionalidade nós nunca saberemos o valor exato do pi.
Para calcular o valor do π é fácil, basta usarmos a seguinte fórmula... deixa quieto:
Se calcularmos o π com 5000 casas decimais, ou seja, apenas escrevendo o número π eu teria uma crônica com 5000 caracteres sem espaços, mas eu não farei uma deselegância dessas. O π já foi calculado com milhões de casas decimais. Por isso o π – embora seja irracional – é muito importante em nossas vidas.
Mas o fato é que entrou nessa história um tal de τ (tau). E dizem os sábios que o τ é mais preciso que o π. O que eu achei um desaforo. A minha vida toda foi estruturada em π e agora vem um talzinho para desbancar o nosso querido 3,14159... não é bem assim.
Os gênios acreditam que o π é impreciso e querem substituí-lo pelo τ. E já consideram o τ uma constante sagrada para a matemática.
O matemático americano Bob Palais acredita que o valor do π está errado e que o correto do número π é o seu dobro, ou seja, 2π. Justifica o Bob que o π é a razão entre o comprimento e o diâmetro de uma circunferência. E que o τ – o dobro de π – é a razão entre o comprimento e o raio, que o matemático acha mais importante que o diâmetro. Por que raios o Bob Palais acha que o raio é mais importante que o diâmetro?
E a turma pró-τ já inventou um dia mundial do τ comemorado em 28 de junho. Mas cabe lembrar que temos o Piday comemorado no dia 14 de março. Como desde já me coloco a favor do inoxidável π já proponho uma festividade para esse dia.
A explicação do cara nesse linque esclarece todas as nossas dúvidas sobre o τ e o π. Simples.
http://www.youtube.com/watch?v=IF1zcRoOVN0
Enfim, se o τ que é o dobro de π é mais exato, passo acreditar que 4 é mais exato que 2. 8 é mais exato que 4 e assim por diante.
Tudo bem que o τ pode ser mais exato que o π, mas o π é mais charmoso tem mais histórias para contar. O π conheceu o Arquimedes. E o τ? Uma invenção de um professor da Universidade de Utah. Um tal de Bob.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Comandante Che Guevara



- Método prático da guerrilha -
Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Che Guevara é um personagem da nossa história recente que virou mito. É um símbolo de luta contra os poderosos. Uma pessoa que acreditou em uma utopia e foi ao seu encalço. Odiado e idolatrado com a mesma veemência. Mas só pela convicção revolucionária merece ser admirado, independente de cores ideológicas.
Che foi um sonhador. É de Guevara a celebre frase “Se você é capaz de tremer de indignação a cada vez que se comete uma injustiça no mundo, então somos companheiros”. Mas a que ficou célebre foi “Hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás.”
Alberto Korda imortalizou a imagem de Che na foto denominada “Guerrilheiro heroico”, tirada em 1960. Che foi cantado em prosa e verso. A música “Hasta siempre comandante” na voz de Nathalie Cardone é emocionante. Um ícone musical em homenagem ao comandante. Che é o principal símbolo da esquerda revolucionaria e sonhadora. Mas também é uma marca comercial em chaveiros, camisetas, cerveja e até pelos biquínis de algumas beldades já andou.
Jon Lee Anderson esmiuçou a vida do comandante nas 920 páginas do livro “Che Guevara uma biografia”.
O assunto Che é inesgotável. Então, chegou nas livrarias o livro “Método prático de guerrilha” de Marcelo Ferroni. Uma obra de ficção sobre os últimos momentos de Guevara na campanha da Bolívia. Um romance baseado em fatos reais. Nesse livro percebemos que Che era um leitor no silêncio da mata. “Guevara adormeceu no chão, cabeça apoiada no braço, o livro aberto com a capa para cima. A Cartuxa de Parma”, página 86. Naquele momento Che lia Stendhal.
Na página 192 a indicação de outras leituras do comandante. “Perderam onze mochilas e Che deixou para trás um livro de Trótski e outro de Régis Debray.”
Também descobrimos que um brasileiro de nome João Batista participou da guerrilha e também sucumbiu na Bolívia.
Marcelo faz uma narrativa envolvente, a leitura flui como os sonhos revolucionários do comandante, mas o Che da ficção é mais humano, vem com suas incertezas e destemperos. Passa “a lo largo” da narração o Che Guevara mito e é por isso que a leitura e boa. Enxergamos o homem revolucionário que foi capturado com meia dúzia de comandados e maltrapilho. Naquele 08 de outubro de 1967 a história chega ao fim.
Talvez o livro merecesse um título mais romântico, mais ficção, algo utópico. Lendo-se apenas o título, parece um tratado técnico de guerrilha, mas não é. É uma bela narrativa de ficção.

Reflexões sindicais

– Um sindicalismo potro sem dono –
Athos Ronaldo Miralha da Cunha

O movimento sindical como um todo – e o bancário em particular – precisa ser repensado. Precisa renascer das cinzas se não quiser sucumbir em definitivo diante dos anseios e demandas dos trabalhadores.
Com a atual conjuntura e com os atuais dirigentes, não vislumbraremos conquistas relevantes para o conjunto da categoria. Hoje, há uma demanda reprimida de conquistas e manifestações. Há um anseio por reivindicações e lutas mais contundentes. E o sindicalismo não está cumprindo com essa demanda, não como cumpria há uma década.
Um exemplo que ficou claro recentemente (de uma demanda reprimida da sociedade) e que serve como alerta aos movimentos sociais, foram as manifestações ocorridas nas capitais do Brasil por ocasião das comemorações do dia da Independência.
Um movimento organizado via internet. Uma ferramenta que mobiliza milhões em tempo recorde e que está alguns passos ou anos a frente dos movimentos sociais. Uma maneira arrebatadora de arregimentação. Um movimento que se originou à margem das centrais, partidos e ONGs. Hoje, qualquer grupo de discussão na internet, ou nas comunidades de relacionamentos na web tem mais informação que uma assembleia de mobilização com meia dúzia de gatos pingados. Assim, percebemos que o movimento sindical continua com a mesma organização de 50 anos atrás.
Essa reflexão deve ser feita pelas categorias de trabalhadores. Nós estamos fazendo o sindicalismo arcaico. Inclusive, as formas de cooptação das atuais direções remontam a Era Vargas, com mais intensidade e adesismo, que nos deixam alarmados e preocupados com o futuro.
Então, para repensar o sindicalismo, a discussão, invariavelmente, passará por uma profunda democratização das entidades e instituições de representação. O modelo como está, está com o prazo vencido. Nossos representantes não representam a base da categoria e, sim, as tendências do movimento. E essas tendências do movimento se engalfinham pelos mais ridículos motivos. Desde a formação de uma simples mesa numa assembleia de dez pessoas a um cargo de suplente de suplente no conselho fiscal do sindicato dos bancários de “Cacimbinhas”. Nosso horizonte de lutas está rebaixado. Falta utopia e uma bandeira para desfraldar. Falta uma “gana missioneira”.
Nossos representantes são eleitos em congressos de dirigentes sindicais – sim, a esmagadora maioria dos participantes dos congressos são dirigentes sindicais – muitos deles há dez, quinze ou vinte anos a frente das entidades. Perpetuados nas direções que dizem sim, sim e sim aos “capas-pretas” do movimento que por sua vez dizem sim, sim, e sim aos governos. Nossas lideranças estão carcomidas e acomodadas em liberações ad eternum.

O atual sindicalismo é pautado pelas eleições sindicais. Têm sindicalistas que passa o tempo viajando para ajudar nessas eleições, pois a disputa é por espaços das correntes, cada vez mais intestinas e truculentas.
É comum vermos discursos inflamados nas assembleias – de companheiro A – baixando o cassete nas políticas da corrente do companheiro B. Mas já na próxima eleição o companheiro A apoia a chapa em que está o companheiro B. Isso é um reflexo da política no Brasil, não existe mais ideologia, o que vale são cargos e “poder” a qualquer preço.

Como são as eleições no movimento sindical e associativo?
Para fazer um comparativo descreverei as eleições nas Apcefs – Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal – e dos sindicatos de bancários.
As eleições das Apcefs são mais democráticas. Nós elegemos, por exemplo, por voto direto tanto para as associações estaduais, como também para a FENAE – Federação Nacional das Associações. Há um edital e as chapas se inscrevem e disputam o pleito expondo suas propostas e explicitando suas diferenças.
Nas eleições dos sindicatos de bancários a democracia tem um certo limite. As eleições para o sindicato são diretas. A categoria vota diretamente nas figurinhas que estão concorrendo. No entanto, quando temos que eleger os membros da Fetrafi-RS – Federação dos Bancários do RS – como também para a Contraf – Confederação dos Bancários – essas eleições se dão de forma indireta em um colegiado (congresso) estadual ou nacional.
Cabe salientar que esses encontros de bancários são na realidade encontros de dirigentes sindicais. A base da categoria tem pouca representação nesses encontros. Arrisco a afirmar que o percentual de delegados dirigentes sindicais beira a 90%. Assim, a base fica totalmente alijada do processo. A base da categoria não sabe quem são os diretores das federações e da confederação. Os nossos negociadores – os colegas que vão negociar a pauta do dissídio com os bancos – são indicados proporcionalmente pelas correntes. E mais uma vez a base da categoria não conhece esses “negociadores”.
E a conseqüência disso? A total falta de representatividade.
Esses colegas dirigentes estão deslocados, sem inserção e conhecimento da base. Aliás, esse desconhecimento é uma via de mão dupla. A base não conhece esses representantes e os representantes não conhecem a base.

A grande questão a ser discutida no sindicalismo – em particular o bancário – é a democratização das representações. Ou seja, eleições diretas para todos os níveis e instâncias: sindicatos, federações e confederação.
E a partir dessa discussão devemos avançar para serem eleitos de forma direta os representantes nas comissões por banco que farão as negociações especificas da categoria. No rol de processo de reformas consta a implementação de uma nova política no que diz respeito às liberações para o sindicato.
Como são as liberações hoje? Os “capas-pretas” de cada tendência se reúnem e decidem as liberações pelas facções. Decidem quem deve ser liberado e esse “liberado” fica comprometido com aquela tendência. Deus o livre se esse companheiro resolver levantar o crachá numa assembleia em desacordo com os ditames da tendência.
Houve um caso de um sindicato com pouco mais de 100 associados teve duas liberações para o Banco do Brasil. E outro sindicato com mais de 1000 associados sem um sequer. Essa é a lógica das liberações quarteadas entre as tendências.
No atual modelo qualquer desavença na direção, um companheiro pode ser “aconselhado” a voltar para o banco, pouco importando sua representatividade ou os desdobramentos financeiros e profissionais de uma volta sem um prévio acordo com os gestores. Com já ocorreu em vários casos.
Então, a questão a ser discutida nos fóruns é justamente a maneira de como devem ser escolhidos os liberados para trabalharem no sindicato. E a resposta é simples: as liberações devem ser dadas pelo número de associados. Por exemplo: um número X de liberados para cada mil associados. Independente das tendências. Independentes dos padrinhos políticos e líder máximo da organização. Assim, teremos um colega comprometido com o sindicato e com a categoria e não com uma tendência ou chefete de ocasião.

Os novos tempos requerem uma nova postura das direções sindicais. Devemos rever algumas estratégias pela mesmice de atuação anos a fio. Assembleísmo e conchavos cabem muito bem para as disputas fratricidas das direções quando não há um horizonte de lutas como ocorre na conjuntura atual. Os sindicatos foram engolidos pelos patrões, mais acentuadamente quando o patrão é o governo federal. Há anos não vemos um enfrentamento de verdade contra o patrão federal. Vemos, sim, direções subservientes e acomodadas que blindaram o governo Lula com apresentação de índices absurdamente rebaixados e continuam blindando o governo Dilma com uma reivindicação de risíveis índices.
Hoje, temos novas ferramentas de mobilização e informação. Com meia dúzia de cliques coloca-se uma informação para o país inteiro pelas redes sociais. E queiram ou não essas ferramentas fazem parte do cotidiano de todas as categorias. E mobilizam muito mais que uma assembleia esvaziada.
Enfim, o sindicalismo precisa ser repensado, caso não queira sucumbir diante dos patrões e diante de uma categoria que – na maioria das vezes – não tem a eloqüência dos “capinhas” mas que tem uma arma que é poderosa na atualidade: as redes sociais.
As redes sociais transformam uma massa de trabalhadores numa comunidade sem dono. Estamos diante de uma nova onda, uma manifestação de um neo-sindicalismo potro sem dono. Mais livre e democrático e mais participativo. “Vai potro sem dono, livre como eu”. Queiram ou não os atuais e perpétuos dirigentes.


Potro sem dono
Letra e música de Paulo Fagundes.
Interprete: José Claudio Machado.