domingo, 4 de novembro de 2012

A luva dourada - conto infantil

Athos Ronaldo Miralha da Cunha 

Jonival era um menino muito pobre. Morava numa vila humilde na periferia da cidade. O caçula de uma família de quatro irmãos, seu nome era o agrupamento dos nomes dos três irmãos mais velhos. As primeiras sílabas de João, Nilton e Valdir formaram o nome de Jonival. Para orgulho dos pais, Adão e Eva, o piá era um estudante inteligente e dedicado. Um belo dia se atrasou na escola por conta dos deveres de matemática e voltou, solitário, para casa. Caía a tarde e o sol deixava o horizonte alaranjado. O colégio ficava a umas dez quadras de sua residência e Jonival fazia o trajeto a pé. Numa escola de alunos pobres os pais não tinham condições de pagar o transporte e a prefeitura oferecia, apenas, a merenda do recreio: um café com pão e margarina. Às vezes um pedaço de bolo de milho com chocolate quente no inverno. 
Caminhava, distraído, por uma estradinha de terra batida – chutando uma que outra pedra do caminho – cantarolando uma música que sua tia ensinara. Tia Ricota contava que quando criança ela morava numa vila em que uma vizinha tinha televisão e ela e os irmãos assistiam a “televizinha” todos os dias. A música era de um antigo desenho animado. 
Ela vem pela montanha, ela vem... Ela vem pela montanha. 
Ela vem pela montanha. Ela vem pela montanha, ela vem... 
Quando, de repente, deparou-se com uma luva dourada no seu trajeto a poucos metros dos trilhos da viação férrea. Estava ali em sua frente brilhante e bonita. Mas, apenas, a luva da mão direita. Jonival não teve dúvidas, colocou a luva dourada e uma grande transformação se processou em seu corpo e nas suas roupas. Como por encanto o guri pobre de uma vila pobre estava vestido com roupas douradas e uma capa azul. Sentiu-se poderoso. O guri sentia estranhas sensações provocadas pela luva dourada. Sentiu-se mais forte, inteligente e mais veloz. Corria por todo lado como a descobrir os poderes que a luva proporcionava. Em dado momento correu com tamanha velocidade que alçou voo. 
Então, com o braço direito esticado voava por sobre o vilarejo e logo estava sobrevoando a cidade toda. A luva puxava Jonival. O guri pobre da vila Saudade tinha estranhos poderes. Era capaz de ver por entre as paredes das casas e ouvir os menores e mais distantes ruídos. 
Assim, ouviu o choro de um bebê. Por alguns momentos duvidou de onde vinha, pois parecia perto. Mas deu-se conta e virou-se como uma flecha na direção do choro e saiu correndo e a correria logo virou voo. Uma criança chorava no berço, estava sozinha em um casebre sem comida e sem alguém para dar alimento. Jonival acalmou o bebê e colocou a mamadeira em sua boca. Logo o nenê estava sorrindo e alguém tentava abrir a porta, que estava trancada. Jonival abriu e viu uma mãe desesperada correndo em direção ao filho. A mãe não percebeu a presença de Jonival. A luva dourada havia deixado o guri invisível. Tentou falar com a mulher, mas ela não ouvia suas palavras. Jonival sai do casebre e percebe uma senhora que havia sido assaltada e um homem correndo com sua bolsa. Mas ele não percebeu a tempo o assalto e não tinha vontade de correr atrás do assaltante. Em seguida ouve uma freada de um carro e o grito de dor de um menino. Em segundos está no local do acidente – ocorrido do outro lado da cidade – e vê um garoto caído no chão e um carro parado em sua frente. Não teve dúvidas pegou o guri e levou para o socorro. Logo em seguida ouve e vê muitas pessoas pedindo por socorro e choro de crianças. Sente calor e sai em desabalada correria em direção ao incêndio de uma casa. Chega ao local do acidente a tempo de socorrer as crianças de uma creche que estava pegando fogo. 
Então, Jonival percebe que a luva é uma protetora das crianças. Os adultos a luva não detecta, mas uma criança em risco de vida ela avisa. E avisa rapidamente. Assim, o guri da roupa dourada ficou famoso na cidade porque era o protetor das crianças em perigo. As crianças salvas descreviam que eram salvas por um anjo dourado de capa azul. Os adultos jamais viram esse anjo, mas sabiam que ele estava sempre atento. As mães saiam tranquilas para seus trabalhos porque sabiam que seus filhos estavam protegidos por uma estranha criança. Uma criança salvadora da roupa dourada e capa azul que vinha pela montanha. 
Essa era a música que as crianças cantavam depois de terem sido salvas de algum acidente. 
Ela vem pela montanha, ela vem... Ela vem pela montanha. Ela vem pela montanha. Ela vem pela montanha, ela vem...

Um comentário:

Michelle disse...
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